No discurso no jantar anual dos jornalistas na Casa Branca,
Stephen Colbert, o autor do programa satírico "The Colbert Report", arrasou completamente Bush, a administração americana e os domesticados media americanos. Com George W. Bush sentado na mesma mesa, Colbert, sob o pretexto de lhe dar o seu apoio, expôs todos os podres do presidente, para estupefacção da assistência.
Vídeo absolutamente imperdível AQUI (24:10m)Transcrição em inglês do discurso de ColbertTradução do discurso:Muito obrigado, senhoras e senhores. Antes de começar, foi-me pedido para dar um recado. Quem estacionou 14 jipes pretos à prova de bala em frente do edifício, pode ir lá tirá-los? Porque eles estão a impedir a passagem a outros 14 jipes pretos à prova de bala e eles precisam de sair.
Mas que honra! O jantar dos correspondentes da Casa Branca.
Estar aqui sentado, à mesma mesa que o meu herói, George W. Bush, estar tão próximo deste homem. Parece que estou a sonhar. Alguém que me dê um beliscão. Sabem que mais? Eu durmo bem com o barulho – pode não ser suficiente. Alguém que me dê um tiro na cara. Ele está realmente aqui esta noite? Diabo, O tipo que poderia ter ajudado.
Já agora, antes de começar, se alguém precisar de alguma coisa na mesa, basta falar lenta e claramente para o nº da mesa. Alguém da NSA aparecerá imediatamente com um cocktail. Mark Smith, senhoras e senhores da imprensa, Primeira Dama, Sr. Presidente, o meu nome é Stephen Colbert e esta noite é meu privilégio homenagear este presidente.
Nós não somos assim tão diferentes, ele e eu. Nós entendemos. Não somos vilões de uma patrulha idiota. Não somos membros dos “factuais”. Agimos em função daquilo que nos está nas entranhas, não é senhor? É onde a verdade está, aqui nas entranhas. Sabiam que temos mais extremidades nervosas nas entranhas do que temos na cabeça? Podem verificar. Já sei que alguns vão dizer “já verifiquei, e não é verdade”. É porque foram verificar isso num livro.
Da próxima vez, vejam nas própria entranhas. Eu fi-lo. As minhas disseram-me como é que funciona o nosso sistema nervoso. Todas as noites no meu show, o « Colbert Report», eu falo directamente das entranhas, OK?
Dou a verdade às pessoas, não filtrada por argumentos racionais. Chamo a isso a “Zona Sem Factos”. Fox News, eu tenho direitos de autor sobre esse termo.
Sou um homem simples com um espírito simples. Possuo um pequeno conjunto de crenças com o qual vivo. Primeiro, eu acredito na América. Acredito que ela existe. As entranhas dizem-me que eu vivo lá. Sinto que ela se estende do Atlântico ao Pacífico, e acredito piamente que tem 50 estados. E não resisto para ver como o Washington Post vai desmentir isto amanhã. Acredito na democracia. Acredito que a democracia é a nossa maior exportação. Pelo menos até a China descobrir uma forma de cunhá-la em plástico a três cêntimos a unidade.
De facto, embaixador Zhou Wenzhong, benvindo. O seu grande país torna possíveis os nossos Happy Meals. É uma homenagem.
Acredito que o governo que governa melhor é o governo que governa menos. E por estes padrões, nós colocámos um governo fabuloso no Iraque.
Acredito que conseguem melhorar a vossa situação sozinhos. Acredito que é possível – vi uma vez um tipo fazer isto no Circo do Sol. Foi mágico. E contudo sou um cristão comprometido. Acredito que toda a gente deve ter o direito a ter a sua própria religião, seja Hindu, Judeu ou Muçulmano.
Acredito que há uma infinidade de caminhos para aceitar Jesus Cristo como vosso salvador.
Senhoras e senhores, acredito que é iogurte. Mas recuso-me a acreditar que não é manteiga. Acima de tudo, acredito neste presidente.
Sei que existem por aí algumas sondagens que dizem que este homem tem uma taxa de aprovação de 32%.
Mas pessoas como nós, não prestamos atenção a sondagens. Sabemos que as sondagens são apenas colecções de estatísticas que reflectem o que as pessoas estão a pensar na “realidade”. E a realidade tem uma bem conhecida propensão esquerdista.
Portanto, Sr. Presidente, por favor, não preste atenção às pessoas que
afirmam que o copo está meio vazio, porque 32% significa que está 2/3 vazio. O importante é que ainda existe algum líquido no copo, mas eu não o beberia. O último terço é normalmente água estagnada. Bom, rapazes, a questão é que eu não acredito que isto seja uma fase má desta presidência. Acredito que é apenas uma trégua antes da recuperação.
Ou seja, é como no filme “Rocky”. Bom. Neste caso o Presidente é Rocky Balboa e Apollo Creed é – tudo o resto no mundo. É o décimo round. Ele está ensanguentado. Ao seu treinador Mick, que neste caso poderia ser o vice presidente, está-lhe a gritar, “Estimula-me, Dick, estimula-me”, e cada vez que ele cai todos dizem, “deixa-te ficar! deixa-te ficar!” Fica ele no chão? Não. Tal como Rocky, volta a levantar-se e no fim... – na verdade, ele perde no primeiro filme.
Bem. Não interessa. O importante é que é a afectuosa história de um homem que foi repetidamente esmurrado na cara. Portanto não prestem atenção às sondagens que dizem que 68% dos americanos desaprovam o trabalho que este homem tem feito.
Pergunto-vos uma coisa, não significa isso também que 68% aprovam o trabalho que ele não tem feito? Pensem nisso. Eu não pensei.
Eu apoio este homem. Apoio-o porque ele representa coisas. Não apenas por coisas, mas nas coisas. Coisas como porta-aviões e entulho e recentemente cidades inundadas. E isso tem um grande significado: não interessa o que aconteça à América, ele regressa sempre – com as mais poderosas fotografias encenadas de celebridades no mundo.
Bom, pode haver uma crise energética. Este presidente possui uma política energética muito avançada. Porque é que pensam que ele está sempre no seu rancho a cortar lenha? Ele está a tentar criar uma fonte de energia alternativa. Em 2008 já devemos ter um carro movido por arbustos.
E eu gosto dele. É boa pessoa. Obviamente adora a sua mulher, chama-lhe a sua melhor metade. E as sondagens mostram que a América concorda. Ela é uma verdadeira senhora e uma mulher maravilhosa. Mas eu já tenho carne, minha senhora.
Lamento, mas este meu discurso. Lamento, nunca fui um fã dos livros. Não tenho confiança neles. São todos factuais, sem coração. Quer dizer, são elitistas, dizem-nos o que é ou não é verdade, ou o que aconteceu ou não. Quem é a enciclopédia Britannica para me dizer que o canal do Panamá foi construído em 1914? Se eu quiser dizer que foi em 1941, esse é um direito que eu tenho como americano!
Eu estou com o Presidente, deixem a história decidir o que é que aconteceu ou não.
O melhor acerca deste homem é que ele é firme. Sabemos o que é que ele defende.
Ele acredita na quarta-feira na mesma coisa em que acreditava na segunda-feira, não importa o que tenha acontecido na terça. Os acontecimentos podem mudar; as crenças deste homem nunca. Excitado como estou por estar aqui com o Presidente, estou apavorado por estar rodeado pelos media esquerdistas que estão a destruir a América, com a excepção da Fox News.
A Fox News dá-vos dois lados de qualquer história: o lado do Presidente e o lado do vice-presidente.
Mas e vocês, o resto dos media. O que é que estão a pensar quando dão as notícias das escutas telefónicas da NSA ou das prisões secretas na Europa Oriental. Estes assuntos são secretos por uma razão muito importante: são extremamente depressivos. Se isso era o vosso objectivo, então, foi levado a cabo miseravelmente. Nos últimos cinco anos vocês foram tão bons – sobre corte de impostos, informações sobre armas de destruição maciça, os efeitos do aquecimento global.
Nós americanos não quisemos saber, e vocês, media, tiveram a gentileza de não tentar descobrir. Estes eram os bons tempos, tanto quanto sabíamos.
Mas, ouçam, vamos rever as regras. Eis como isto funciona: o Presidente toma decisões. Ele é o decisor. O assessor de imprensa anuncia essas decisões, e vocês, malta da imprensa, escrevem essas decisões. Decidir, anunciar, escrever. Passem o texto por um corrector ortográfico e vão para casa. Para junto da vossa família novamente. Façam amor coma vossa mulher. Escrevam esse conto que anda a deambular nas vossas cabeças.
Sabem, aquele em que um repórter intrépido de Washington com coragem para enfrentar este governo. Vocês sabem – ficção!
Porque na realidade, que incentivo tem esta gente para responder às vossas questões, afinal? Quero dizer, nada vos satisfaz. Todos pedem por remodelações de gente do governo. Logo a Casa Branca faz essas remodelações. Então vocês escrevem, “Oh, eles estão apenas a reajustar as cadeiras do convés do Titanic”. Em primeiro lugar, esta é uma metáfora terrível. Esta administração não se está a afundar. Esta administração está a levantar voo. Se estão a reajustar algumas cadeiras são as do Hindenburg! [o balão dirigível Hindenburg incendiou-se ao chegar ao aeroporto de Lakehurst nos EUA, e literalmente desapareceu em poucos minutos].
Bom, não há só maus rapazes por aí. Alguns são heróis: Christopher Buckley, Jeff Sacks, Ken Burns, Bob Schieffer. Todos eles estiveram no meu show. Já agora Sr. Presidente, obrigado por ter aceite estar presente no meu show. Eu estava tão chocado como qualquer um aqui, juro-vos. Como é que está a ser a terça-feira para si? Eu tive lá Frank Rich, mas não o podemos injuriá-lo. E eu quero dizer injuriá-lo.
Vamos lá ver quem é que temos aqui esta noite. General Moseley, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea. General Peter Pace, presidente dos Chefes do Estado-Maior.
Estes ainda estão com Rumsfeld. Bom vocês ainda não se reformaram, pois não? Exacto ainda estão com Rumsfeld.
Olhem, já agora, tenho uma teoria acerca da forma de lidar com estes generais reformados que estão a levantar todo este problema: não os deixem reformar-se! Vá lá, arranjem um programa pára-perdas; vamos usá-los aí. Já vi o Zinni e aquela multidão no programa de Wolf Blitzer.
Se têm força suficiente para ir a um desses programas, então também têm para estar num teclado de computador a enviar homens para a batalha. Vá lá.
O reverendo Jesse Jackson está cá. Não tenho ouvido falar dele já há algum tempo. Já o tive no meu show. Uma entrevista muito estimulante e interessante. Pode-se perguntar-lhe tudo, mas ele só vai dizer o que quer, ao ritmo que ele quer.
É como dar murros num glaciar. Aproveitem a metáfora, porque os vossos netos não vão fazer ideia do que um glaciar é.
O juiz Scalia está cá. Benvindo, senhor. Posso ser o primeiro a dizer que você está fantástico. Como está? [Após cada frase, Colbert faz um gesto manual, uma alusão ao uso recente de um gesto obsceno por Scalia ao falar com um jornalista. Scalia ri histericamente]. Estou apenas a falar siciliano com o meu paisano.
John McCain está cá. John McCain, John McCain, que dissidente! Aluém sabe que garfo é que ele usou na salada, porque garanto-vos que não era um garfo para saladas. Este homem pode ter utilizado uma colher. Não é previsível. Já agora, senador McCain, é tão bom vê-lo voltar para a congregação Republicana. Tenho uma casa de férias na Carolina do Sul; procure-me quando for falar na Universidade Bob Jones. Estou tão contente por o Sr. ter visto a luz.
Mayor Nagin! Mayor Nagin de Nova Orleães está cá, a cidade de chocolate! Sim, desista. Mayor Nagin
quero desejar-lhe boas-vindas a Washington, D.C, a cidade de chocolate com um doce no centro. E uma crosta de corrupção. É um doce, penso que é o que eu estou a descrever, um biscoito periódico.
Joe Wilson está cá, Joe Wilson mesmo aqui em frente, o marido mais famoso desde Desi Arnaz. E, claro, trouxe a sua maravilhosa mulher Valerie Plame. Oh, meu Deus. O que é que eu disse? Desculpe Sr. Presidente, queria dizer que ele tinha trazido a sua maravilhosa mulher, a mulher de Joe Wilson. Patrick Fitzgerald não está cá esta noite? Ok, safou-se.
E, claro, não podemos esquecer o homem do momento,
o novo assessor de imprensa, tony Snow. Nome de código, “Snow Job”. Emprego difícil. Que herói. Ficou com o segundo emprego mais difícil do Governo, a seguir, evidentemente, ao de embaixador no Iraque.
Arranjaste uma boa trabalheira, Tony, uma boa trabalheira. Scott McClellan conseguia dizer coisas como ninguém. McClellan, claro, desejoso da reforma. Sentiu realmente que precisava de passar mais tempo com os filhos de Andrew Card. Sr. Presidente, gostaria que não tivesse tomado a decisão tão depressa.
[Segue-se uma conferência de imprensa de Colbert a gozar]