O avesso decidiu por mim
e forçou o dedo a espremer
extraindo o gemido contido
na garganta seca.
A palavra enroscada na alma
estraçalhando o eu pacífico
como se fosse intencional abrir espaço
para o trovão.
Relampeei.
Montei os cavalos na ventania
e, sob o exaspero,
apertei os calcanhares contra a barriga do animal.
Houve novo grito,
também novo gemido
e muito sangue
onde esperava-se que houvesse flor
havia água
um pântano pétreo de líquido espesso
e hediondo
que insistia em vazar
pelo meu enorme olho de vidro.
No amor o outro dói
dilacera
assovia alguma magia negra
que obriga a visão ao desmaio
na base da pancada.
Vai cavalo, vai!
Atravessa esse deserto
deixa a tua crina esvoaçar o vinho
que nasce das tuas entranhas.
Geme cavalo, geme!
e relincha o teu desgosto no vazio
rincha a tua voz,
que é a mesma dos burros,
e apavora-te no teu correr incessante
queima o teu peito
e os teus pulmões
até ensinar a mente
que o campo é enorme
que o horizonte é inalcançável
mas que as tuas patas não se deterão
até encontrares charco tranquilo
e puderes, mais uma vez,
deitar-te no chão.
Meus pés doem
mas é pelo fato
de não me render:
um dia o meu cavalo
ainda aprende
a voar.
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