AOS ATLETAS DA BRIOSA
Joguem por uma causa…
Caros amigos, atletas da Briosa, Associação Académica de Coimbra
Aproxima-se o grande dia.
Creio que todos sabem ao que vão e que todos sabem aquilo que se espera de vós.
Pisar o relvado do Jamor, envergando a camisola negra, será decerto uma das maiores honras que muitos de vós irão ter, nas respetivas carreiras desportivas, mesmo que a fortuna do futebol vos bata à porta e que venham, um dia, em representação de outros emblemas, a jogar dérbis de exceção, finais europeias, ou outros jogos que, pelo seu mediatismo, povoam o imaginário de qualquer futebolista.
Esta será uma oportunidade única, para cada um de vós, de representar uma causa, um ideal, uma cultura, um “modus vivendi”, uma especial idiossincrasia que só a Lusa Atenas e a sua Academia apresentam e não apenas de fazer parte de uma mera e simples equipa de futebol, em dia de jogo importante.
Dentro das quatro linhas, em cada bola dividida, estará assim em jogo a especial forma de ser dos estudantes de Coimbra, que jamais tiveram medo da história e que, por mais difíceis que fossem os tempos, sempre souberam pontuá-la da irreverência da sua juventude, da generosidade da sua conduta, da solidariedade do seu carácter coletivo, da expressão e da força da sua, tão duramente conquistada, liberdade associativa.
Em cada lançamento, em cada passe longo, estarão presentes mais de sete séculos da história do conhecimento luso, recheados de génios da matemática, da física, da química, da astronomia, de famosos e aclamados juristas, engenheiros e economistas, de reputados e consagrados escritores e filósofos, de médicos de nível mundial.
Em cada livre, direto ou indireto, estará a nossa juventude, quando a capa negra se soltava ao vento e a liberdade parecia não ter fim, entre visitas noturnas à romântica quietude do Penedo e improvisadas serenatas, ali mesmo, junto ao rio, onde os fortuitos raios de luar refletiam, nas mansas águas do Mondego, o melhor tempo das nossas vidas.
Em cada lance do jogo aéreo ouvir-se-ão, melodiosos, os acordes das guitarras do Hilário e do Paredes e ressoarão, tonitruantes, as inigualáveis vozes do Menano, do Goes, do Zeca e do Adriano, cantando Alegre, em doces trovas, que logo se espalharão ao vento, num quadro de perfeita harmonia.
Em cada sucessão de passes, nos transportaremos à Quinta das Lágrimas, para recordar os amores de Pedro e Inês, aos claustros do convento de Santa Clara, para evocar o milagre da Rainha, que de pão fez rosas, ou ao Mosteiro de Santa Cruz para, respeitosamente, nos curvarmos perante o túmulo do fundador da Pátria.
Em cada reposição de bola em jogo se ouvirão os adeptos, espalhados por todo o planeta, que normalmente estão com as suas Académicas, que nem a descolonização extinguiu, em Angola, em Moçambique, em Cabo Verde, em Goa, em Timor, mas que, no domingo, terão seguramente os corações no Jamor, palpitando pela «casa-mãe»
Em cada pontapé de canto e em cada cruzamento para a área, se reconhecerão as sucessivas gerações de académicos que, por uma razão ou por outra, na cultura, no desporto, na atividade cívica e associativa, usaram ao peito o carismático e centenário emblema losangular da velha torre, tornando-o num dos mais admirados e amados de todos os símbolos portugueses.
Em cada remate, estarão ali, paredes meias, as estreitas ruelas da baixa, a sombra dos arcos do jardim, as pedras do largo da Sé Velha, o bulício da Praça 8 de Maio, a altivez do Arco da Almedina e a Torre, a vigiar lá do alto, uma cidade que, mais do que berço da cultura, ou património do Mundo, se afirma como campeã de Saudade, essa palavra mágica, que só se diz e soa, na língua de Camões.
Em cada golo, se vislumbrará, enfim, com desusada nitidez, a especial luminosidade que só a nossa querida Coimbra é capaz de possuir e perpassarão então, pelas nossas memórias individuais, em vertiginoso simultâneo, todas as imagens, lugares, referências, personalidades, princípios e valores de que se compõem a história e o ideário do “clã académico”.
Sei bem da tremenda força interior e da anormal coragem que serão necessárias para representar tudo isto e sinto a enorme responsabilidade que, em cada um vós, pesará.
Mas também sei que, como sempre acontece, tudo passará num fugaz instante, mal o árbitro apite para o início do sonho.
Depois, enquanto ele durar, é preciso acreditar e dar tudo, com o brio que sempre nos caracterizou.
Se a Taça voltar para casa, ótimo!
Mas se, por contingências do destino, assim não acontecer, que se deixe claro que, mais uma vez, jogámos por uma causa…
Que se deixe em campo a inigualável marca de Coimbra, que é capaz de transformar derrotas episódicas, em memoráveis vitórias que a história contará e das quais, todos vós, serão eternos heróis.
FORÇA MALTA!
VIVA COIMBRA! VIVA A ACADÉMICA!
Fernando Pompeu
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