Dia desses, lembrei com muitas saudades dos agitos da Ilha, nomeadamente a noite de sábado no Chill Out, quando fecha o restaurante e vira uma discoteca metida à besta, cara até não dizer mais (USD 30 dólares, só para surgir e sorrir) e cujos critérios de seleção para saber quem entra rápido ou fica mofando na fila são mais abstratos do que os utilizados pela Real Academia de Ciências da Noruega para entregar o Nobel a Obama, recentemente.
Se você é homem, branco, e vai lá desacompanhado, fica no mínimo uma hora na fila para entrar. Se chega acompanhado de uma dama – seja ela uma catorzinha angolana ou uma brasileira mais saliente – passa na frente de todos e vai ser feliz imediatamente. No zunzunzun do sereno, carteiradas, sabem com quem está falando, conversas ao pé do ouvido e, claro, flertes, muitos flertes. Casais de angolanos bem nascidos não ficam um segundo à espera.
Lá dentro, um mundo artificial formado pela mistura de mwangolês com expatriados chama atenção. Todos estão no desespero para ver e ser visto, acabar a noite bem, no sentido bíblico, se os leitores inteligentes dessa Casa compreendem. Nuvens de catorzinhas diáfanas sobrevoam tugas horríveis nas suas camisas xadrezes de manga curta. Brasileiros mal-educados, por seu turno, diluem-se em litros de uísque e passam a se sentirem um Rockefeller da vida. Os de Pernambuco são os piores. Os papos geralmente começam em inglês e depois evoluem para a língua de Camões, sempre com a clássica pergunta: “você está em Angola há quanto tempo”?
O tumps-tumps das “mesas misturadoras” é ótimo. DJs evergando camisetas geralmente da grife Dolce & Gabanna fabricada no Dubai ou na China, além de óculos escuros imensos e cintos dourados, fazem às vezes de Jesus Luz - o namorado brasileiro da Madonna que agora meteu-se a Malvado - sem perceberem que nós notamos que tudo tocado ali é playback. Ah, que saudades do Kuduro sampleado ou da última versão de um house tocado no ultimo verão em Ibiza tendo o mar ao pé de si no Chill Out...
A noite avança... O uísque faz efeito...
Numa rodinha, um grupo de curitibanos – chatos como só um carnaval ao lado de uma namorada com TPM pode rivalizar – destilam pérolas como “ah, eu não vejo a hora de ir de férias para o Brasil”. Do lado, uma portuguesa afirma, em alto e bom som: “gostava imenso de conhecer um brasileiro mais a fundo…”. Então tá, vamos nessa. Quando toca o Créu, caem por terra os 500 anos de educação promovidos pela colonização nos dois lados do mar, isso tudo nas tais cinco velocidades.
No final da festa, lá pelas cinco da manhã, jipes imenos enfileira-se à porta, à espera que os grupinhos que se formam na calçada – a hora final é a de maior desespero, pois agora só sábado que vem, por isso ainda dá tempo – decidem se vão todos para o Talatona ou a baladinha pode continuar por ali, pela cidade, nos domínios de quem tem mais privacidade e não precisa dividir 100 metros quadrados com mais seis pessoas.
No final do dia, alguns integrantes dessa peça de teatro que tem lugar todos os sábados no Chill Out encontram-se num dos vários restaurantes da Ilha e, de óculos escuros, nem confiança para os demais.