08 janeiro 2017

Dos bancos no outono

Sentei no banco que você disse que me daria. Você disse que sabia quem eu era, como eu era, o que eu merecia e que amanhecer aos domingos era bom. Lia um futuro nosso que era ao mesmo tempo virando a esquina e cruzando a ponte do Brooklyn, promessas de futuros distantemente próximos ou proximamente distantes. No início do outono já não havia você e eu não sabia mais quem eu era. Me des-conheci.

Sentou-se no banco, então, quem não me conhecia. Quem não me sabia por dentro nem olhara nos meus olhos, a quem faltavam os segredos e sobravam revelações. Precisei sentar com quem não me conhecia para me re-conhecer. Olhar para nenhum reflexo e me achar, para saber de novo quem eu era: doída de cacos colados, uma outra. Foi necessário ensinar a alguém quem eu era para ser de novo eu. A descoberta de alguém como um grande continente intocado e pronto para ser compartilhado. Eu merecia bem mais, do seu conhecimento de mim surgia eu novamente.

Sentei no banco que você disse que me daria. Não sentei só. Não sento mais só. Estou sempre comigo novamente.

18 setembro 2015

Sobre o ritmo

Incauto entre arritmias e extrassístoles, meu coração segue firme pulando compassos.

21 julho 2015

Do Diário de Suelen Gueiras



Aquele dia em que me mudei.

Eu, novamente eu. Eu quieta no meu ninho, eu, quieta, arrulhando no meu novo quintal e você, que nem criança, invadindo meu espaço sem ser convidado. Não foi. Não tenha dúvidas, não queria te ver. De mim há apenas essa reação automática eriçar meu pelo quando te vejo. Você é tão bonito e eu arregaço meus dentes. Finjo não te ver, finjo não querer fugir, finjo não sentir raiva. Sai um suor defensivo das minhas axilas, como se eu estivesse a beira de uma luta. Você não percebe, não sobe a guarda. Você acha que está tudo bem. 

Não está.

Eu e meu rabo entre as pernas até quando. Até quando.

23 abril 2015

Do Diário de Suelen Gueiras

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Depois do aniversário. 

Já não sinto falta dos leitos da Expresso Brasileiro, já repassei meu Bilhete Único, já esqueci se Jabaquara ou Tucuruvi. Já parei de ouvir aquelas músicas. Já não acho que você sinta falta de mim e isso já não me entristece mais. Já vejo minha vida sem você. E, apesar de tudo isso ter saído de mim como um ciso, com todo o sangue pisado que essas extrações requerem, há algo ainda inescapável. Algo que ficou mesmo depois de tudo seu que tirei de mim, camada por camada, até ficar nua de você...
........ ainda escolho os vestidos pensando que você vai tirá-los. Porque o olhar que você dava ao me ver em um era sempre o olhar que mais me refletia e quando fechavam o zíper seus dedos roçavam as minhas costas com um cuidado que parecia o cuidado que você teria comigo pelo resto do tempo. Vesti-los havia se tornado esse pequeno ritual de nós e, de tudo que consegui me despir, esses vestidos e essas verdades permanecem em cabides bem guardados... 
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05 novembro 2014

Amor é tempo

Eu demorei para acreditar em nós porque amor é tempo. Nós sempre tínhamos um prazo, nós estávamos sempre acabando, na beira do fim e correndo contra ele. A gente se divertia vencendo o espaço, sem tempo, sem envelhecer. Eu demorei para acreditar em você. Mais ainda, demorei a acreditar em mim, em quem eu era e em quem você via.  Mas os dias passaram, o espaço não mais dava conta e então, chegou o momento em que eu só tinha tempo pra você. Eu tinha boca, mãos, sorrisos, esperança e tempo. Você pareceu se deter e me esperar e pareceu que me encaixava no seu tempo e você no meu, como encaixávamos em todo o resto. E acreditei em você e, finalmente, acreditei em quem eu era. No nosso espaço houve, então, o tempo. Porque paramos de correr contra o final, porque eu te esperava e sabia que você vinha na hora certa, porque pareceu que o tempo era domado e nosso e inofensivo. Mas, porque amor é tempo é, assim, parte de nós. Sabemos do nosso tempo, do nosso amor e de mais ninguém. Do outro, espera-se a coragem e a possibilidade da sincronia. Corações arrítmicos não tem tempo nem compasso nem sincronia, estes batem como querem e quando querem. E amor é tempo.
Porque amor é tempo.
Porque amor é tempo.
Porque amor é tempo.
Porque, amor, é tempo
de assumir que você nunca teve tempo para mim.
 

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