A carta estava debaixo da porta. Nem precisou procurar o rementente, já sabia que era dela. A letra tremida dizia:
Eu acho que só ouvisse.
Eu acho que estou em surto.
Eu acho que estou com medo.
Eu acho que tenho um treco.
Eu acho que errei a conta.
Eu acho que me esqueci.
Eu acho que vou morrer.
Eu acho que só mentira.
Eu acho que me assustei.
Eu acho que me arrependo.
Eu acho que fiz besteira.
Eu acho que ainda aprendo.
Eu acho que não consigo.
Eu acho que vou morrer.
Eu acho que nem sonhar.
Eu acho que errei a porta.
Eu acho que fugi do timing.
Eu acho que rebaixaram o céu.
Eu acho que roubaram o chão.
Eu acho que sumi da sala.
Eu acho que fui embora.
Rasgou tudo bem pequeno. Lembrou da frase que o pai dizia: "felicidade é um momento de concentração". Ajeitou o botão do paletó, vestiu óculos escuros, o canto direito da boca se ergueu indisfarçavelmente e ele saiu pela manhã afora assoviando “Por una cabeza”.