quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Alvorada


Alvorada

Lá no morro que beleza
Ninguém chora não há tristeza
Ninguém sente o dissabor
O sol colorindo
É tão lindo, tão lindo
A natureza sorrindo
Tingindo, tingindo

Você também me lembra a alvorada
Quando chega iluminando
Meus caminhos tão sem vida
E o que me resta é bem pouco
Quase nada
Do que ir assim vagando
Numa estrada perdida.

* Cartola*

quarta-feira, 8 de julho de 2009

não fosse isso


não fosse isso
e era menos
não fosse tanto
e era quase


*Paulo Leminski*

terça-feira, 7 de julho de 2009

Resíduo


(...) Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.
Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.
(...) E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.


* Carlos Drummond de Andrade*

sexta-feira, 27 de março de 2009

O último poema


Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

*Manuel Bandeira*

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

...


"Então, de repente, sem pretender, respirou fundo e pensou que era bom viver. Mesmo que as partidas doessem, e que a cada dia fosse necessário adotar uma nova maneira de agir e de pensar, descobrindo-a inútil no dia seguinte - mesmo assim era bom viver. Não era fácil, nem agradável. Mas ainda assim era bom. Tinha quase certeza."


Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

...


Eu acho que Deus é uma projeção humana. É um desejo infinito que nós temos de adoração, e de algo que nos suspende com o sentido absoluto. Nós somos finitos e relativos, e queremos sempre uma coisa absoluta: que esse café maravilhoso não acabe, que a minha paixão não acabe, que essa casa bonita permaneça. A gente tem sede de infinito e de permanência. Então, esse ser que assegura a permanência das coisas, é que eu chamo de Deus. É o absoluto.


*Adélia Prado*

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

...


Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."


*Clarice Lispector*

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Feliz Ano Novo!!!


...A vida não tem ensaio, mas tem novas chances.
Viva a burilação eterna, a possibilidade, o esmeril dos dissabores!
Abaixo o estéril arrependimento, a duração inútil dos rancores.
Um brinde ao que está sempre nas nossa mãos:
a vida inédita pela frente e a virgindade dos dias que virão.


*Elisa Lucinda*

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Poema de Natal


Para isso fomos feitos: Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos...
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida: Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos ...
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver a noite ,dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer: Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai ...
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos: Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte ...
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas nascemos, imensamente.


*Vinícius de Moraes*

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Querem meu sangue


Querem meu sangue
Vou até a loja mais cara,
compro a jarra mais bonita
E despejo,
como num gesto nobre,
cada gota.
Entrego a jarra,
todas as taças
e assisto da platéia
o prazer explícito da degustação
Ao terminar o espetáculo
volto para casa,
descanso,e me preparo
para existir no dia seguinte,
para observar o desejo,
em cada gesto,
em cada olhar.
Querem meu sangue,
pois conhecem o gosto.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Trovas de muito amor para um amado senhor


Nave
Ave
Moinho
E tudo mais serei
Para que seja leve
Meu passo
Em vosso caminho.

Dizeis que tenho vaidades.
E que no vosso entender
Mulheres de pouca idade
Que não se queiram perder

É preciso que não tenham
Tantas e tais veleidades.

Senhor, se a mim me acrescento
Flores e renda, cetins,
Se solto o cabelo ao vento
É bem por vós, não por mim.

Tenho dois olhos contentes
E a boca fresca e rosada.
E a vaidade só consente
Vaidades, se desejada.

E além de vós
Não desejo nada.
*Hilda Hilst*

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Certas Palavras


Certas palavras não podem ser ditas
em qualquer lugar e hora qualquer.
Estritamente reservadas
para companheiros de confiança,
devem ser sacralmente pronunciadas
em tom muito especial
lá onde a polícia dos adultos
não adivinha nem alcança.
Entretanto são palavras simples:
definem
partes do corpo, movimentos, atos
do viver que só os grandes se permitem
e a nós é defendido por sentença
dos séculos.
E tudo é proibido. Então, falamos.
*Carlos Drummond de Andrade*

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

...


O amor não se tem na hora que se quer, ele vem no olhar.sabe ser o melhor na vida e pede bis quando faz alguém feliz.


*Marcelo Camelo*

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Sósia


Mas que desagradável mania
tem a humanidade
de se tornar subitamente parecida
com o amor da gente:
Todos roubam a cara e os particulares sinais
do amor que a gente espera
do amor que a gente erra.
De tanto confundí-lo de longe na rua
vou mamando a poesia desse equívoco
como quem menstrua em lugar de filhos.
A saudade arma um circo onde
palhaços e garis
têm cara do com quem eu seria feliz.
Diante do meu nariz, vou jurando que é ele.
Cada rosto, cada passo, cada traço
vou jurando que é dele
e me engano nas ruas
bebendo nesse diapasão
de uma perigosa e destilada bebida
que se toma de ilusão.

*Elisa Lucinda*

terça-feira, 18 de novembro de 2008

DONNA MI PRIEGA 88


se amor é troca
ou entrega louca
discutem os sábios
entre os pequenos
e os grandes lábios
no primeiro caso
onde começa o acaso
e onde acaba o propósito
se tudo o que fazemos
é menos que amor
mas ainda não é ódio?

a tese segunda
evapora em pergunta
que entrega é tão louca
que toda espera é pouca?
qual dos cindo mil sentidos
está livre de mal-entendidos?

*Paulo Leminski*

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

resistência


um pote cheio
do furor que escorria dos teus olhos
guardei
porque gastamos todas
as nossas mãos
e restou inteiro
esse sentimento
enrugado
que não
passa

*Mariana*

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

...


"Assim como ossos, carne, intestinos e vasos sanguíneos estão encerrados em uma rede que torna a visão do homem suportável, também as agitações e paixões da alma estão envolvidas pela vaidade; ela é a pele da alma."


*Nietzsche*

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

...


Para atravessar uma rua, passos.
Para atravessar uma montanha, trilhas.
Para atravessar uma colina, túneis.
Para atravessar um rio, pontes.
Para atravessar um coração, palavras.

*Fábio Fabrício Fabretti*
(http://www.ficcionista.blogger.com.br/)

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A arte de amar


Se queres sentir a felicidade de amar,
Esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixe o teu corpo entender-se com outro corpo,
porque os corpos se entendem, mas as almas não.


*Manuel Bandeira*

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Renova-te


Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica-se os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
Para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro.
Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo.


*Cecília Meirelles*

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Todo o sentimento


...
Prometo te querer
Até o amor cair
Doente
Doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro, com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei, como encantado
Ao lado teu


*Chico Buarque*

...


sossegue coração
ainda não é agora
a confusão prossegue
sonhos afora
calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa


*Paulo Leminski*

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Abstrato


eu nunca beijei um poema.
no entanto ele está aqui
roçando leve minha
boca
nas horas dos
mais
doídos
silêncios


*Mariana*

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

...


Branca, preta ou amarela
A ariana zela.
Tem caráter dominador
Mas pode ser convencida
E aí, então, fica uma flor:
Cordata... E nada convencida.
Porque o seu denominador
É o amor.

*Vinícius de Moraes*

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

...


...E se um dia você olhar pra mim e não souber o que fazer lembre-se de tudo o que já foi dito e feito nesse mundo. Lembre-se que não serás o primeiro nem o último. Que as coisas, os atos e as pessoas apenas se repetem num ciclo monótono e insano...


*autor desconhecido*