segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Fechados



Dobrou as palavras e guardou-as num envelope que fechou numa gaveta.
Parou os ponteiros do relógio, que se desdobravam em tempo duma vida, e guardou-os numa gaveta.
Numa mesma gaveta, as palavras ficaram fechadas num tempo sem vida.
E sem que houvesse tempo para as palavras, a vida fechou-se numa gaveta. Esquecida...

domingo, 31 de outubro de 2010

Soubesse eu viver na saudade

foto da minha Canon

Soubesse eu viver na saudade,
que não te diria
haver um banco, na felicidade,
onde só me sento
quando te sinto chegar…
e por detrás dele
as janelas dum sorriso
cerram-se na tua espera.

Constatação


Como as folhas num lago de Outono,
amontoa-se ignoto o amor que [já] não cabe no teu tempo.

Na espera


Nada te quero pedir…
para beber gota a gota,
esse prazer
de te receber
oferta em que te dedicas
imprescindivelmente
minha…

Nada te quero pedir…
e por isso aguardo
e te espero…

Nada te quero pedir…
e por isso me derrubam
as horas
em que não nos necessitas,
e as nossas histórias
passam distantes
como desconhecidos
que nunca ousaram
se cruzar…

sábado, 30 de outubro de 2010

Às vezes...


Às vezes…
és raio de sol
derramando-te no meu poema
e a minha pele arrepia-se
no suspiro
que te adivinho,
em que te invento.

Às vezes…
és Verão
espraiando-se na seara dos meus pensamentos
e a tua presença
ceifa as espigas da incerteza
semeadas pela ausência do teu olhar.

Às vezes…
és semente furtiva
entre as páginas dum livro
em que te fechas,
nas palavras que tardam
ou não te aprendi a ler.

Às vezes…
és gota de chuva
por que teimo esperar
e converto em minha sede,
és lágrima de orvalho
incendiando o meu corpo
mas que não sei guardar
durante os Invernos
em que te furtas.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Na suspensão dos nomes



Acorda-me o coração
um pêndulo com teu nome,
brisa matinal
humedecendo as sílabas
nas paredes do meu peito,
em navegação inquieta
o receio
sobre a incerteza da tua estância,
a prazo sem data,
com limite,
a termo por definir.
Embarco nessa asa
que a tua presença me abre,
seguro na mão
o nó por ti deslaçado
e enlaçado na pegada dum abraço,
onde me suspendo nos ponteiros
das letras que recito
para adormecer meu nome
na ladainha do teu sono.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Clamor de carne



Quero-te
neste abraço
que o meu corpo pede
por te precisar,
nesta pele
que se despe,
para te ser carne
invadindo
a nudez
com que me vestes
nesse abraço
que tarda
em nos clamar.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

No teu abraço



No teu abraço
faço de conta que não existo
e deixo-te seres
carne do meu desejo...

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

'Os livros que estou a ler' com Graça Morais

imagem recolhida aqui

Ainda gosto de ouvir histórias. Mais me encanto quando elas narram episódios vividos com personalidades que aprendi a ler, a ouvir, a olhar. No passado dia 12, sentei-me no auditório da Casa Fernando Pessoa, para assistir a uma conversa de Inês Pedrosa com Graça Morais, acerca de livros. A directora da casa anfitriã fez uma sucinta apresentação biográfica da pintora, aludindo às exposições patentes no espaço sobre duas obras de parceria de Graça Morais com Sophia de Mello Breyner Andresen: Orfeu e Eurydice e O Anjo de Timor. E foi por esta relação com a poetisa que a artista plástica iniciou a conversa testemunhando o deslumbre que lhe causara a escritora numa viagem que realizaram, integradas numa comitiva presidencial, à Grécia. Os trabalhos de Graça Morais que constituem a exposição Orfeu e Eurydice foram realizados em papel para partitura. O papel branco não lhe é confortável, revelou. E aquelas folhas, usadas pelo marido Pedro Caldeira Cabral para transposição de partituras clássicas, têm desde logo as linhas das pautas. Graça Morais enunciou alguns dos escritores com quem interpretou colaborações, na ilustração das suas obras escritas: Manuel António Pina, José Saramago, Augustina Bessa Luís, Miguel Torga, etc. Falou das suas primeiras experiências de leitura quando as bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian levavam a Trás-os-Montes, livros que tinham de ser lidos em cerca de quatro dias. Leitora especialmente de ficção, tem em A Sibila, de Augustina, um dos livros mais memoráveis por ter reencontrado nas personagens a vivificação das suas próprias tias. Natural de Vieiro, Graça Morais tem ascendências rurais, por parte da família materna, e algo mais erudita, por parte da paterna. Com conhecimento de causa, defendeu a importância do tratamento da terra para acreditar na vida. Os que, por exemplo, cultivam uma horta, argumentou, são estimulados pelo cíclico renascer; mesmo quando algo corre mal, sabem que será uma fase pois a Primavera voltará a regressar. Graça Morais falou ainda do seu fascínio por Cabo Verde e do seu interesse, enquanto leitora, por obras acerca do acto criativo. Referiu alguns livros que tem em mãos e que deixou como sugestões de leitura: Nelson Mandela, uma lição de vida, de Jack Lang ou O Livro da Consciência, de António Damásio. Confessou que se, hoje, tivesse possibilidade refaria as ilustrações de O Ano de 1993, de Saramago concedendo-lhes maior liberdade. E falou de África, da empatia que tem pelo povo daquele continente e da forma como ele interfere em alguns dos seus trabalhos.

Para quem esteja interessado, a Antena 1 transmite na íntegra, esta conversa, na próxima sexta-feira, dia 15 pelas 21h00.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Noite vaza


Engravida de espera
este tempo em que te aguardo,
à beira-noite,
na ansiedade da enseada,
e que as tuas ondas de desejo
molhem as praias do meu corpo
e a espuma da entrega
permaneça sem horário
na memória das peles
até ao gerar dum novo abraço.