quinta-feira, agosto 26, 2010

O Enredo do meu Samba




Todas as vezes que a Nívea falava sobre fazer um samba enredo para a Beija Flor eu respondia: Vamos sim!
Esse é o jeito carioca de ser. Você diz que tudo bem, mas na verdade isso quase nunca se concretiza.

Talvez por isso eu não tenha acreditado quando ela novamente tocou no assunto logo após a escolha de Roberto Carlos como o enredo da escola para o desfile de 2011. Eu estava enrolada com o final do mestrado e só despertei para a verdade de tantas palavras dela, quando li no meu orkut um recado que dizia:

- Meu pai já nos inscreveu. O nosso samba se apresenta no dia 9 de agosto.

O que aconteceu a partir daí é inacreditável.
Nunca fui sambista, daquelas de ir à quadra, ver o desfile, chorar na apuração. Torcia pela Portela, mas de um jeito discreto e quase hereditário. Nunca fui compositora, nem de música romântica como quase todos que gostam de poesia é na adolescência, muito menos compor samba. Não entendo nada de harmonia, batida, frases melódicas e por aí vai. Mas a verdade é que quando dei conta estava reunida com sambistas escrevendo o poema que iria gerar a letra desse samba enredo.

Escrevi 60 linhas iniciais. Nívea comandou os cortes. Um amigo acertou a harmonia e o samba começou a ser lapidado. Até a versão que gravamos, em um estúdio localizado em Pilares, foram vários encontros, reuniões, troca de emails, horas de msn e gravações no celular. O processo criativo nesse caso é rico e coletivo. Isso une as pessoas, transforma, agrega valores...é fantástico.

Com o cd pronto, entregamos na escola e confirmamos a nossa inscrição. Na apresentação estávamos nervosas, cada uma num canto, sem querer muita conversa. Não sabíamos se o samba seria aceito bem pelos jurados. Mas foi, passamos entre os 54, depois entre os 26 e agora estamos entre os 15 melhores sambas.

Exatamente hoje será decidido se essa trajetória continua ou se interrompe nesse ponto. Entre ansiosa e feliz acordei pensando em tudo que já ganhei desde que essa história começou. Conheci gente nova, gente interessante, gente amiga, gente com realidade diferente da minha. Conheci lugares novos, lugares distantes, lugares onde nunca imaginei estar. Conheci sentimentos novos. Sentimento de parceria, amizade, sentimento de acolhimento em um grupo de pessoas maravilhosas.

Se quero ganhar? É claro. Porém, dentro da dificuldade que naturalmente existe para duas novatas, não criei espectativas de resultado. Tudo que escrevi pra vocês, foram ganhos. Esse prêmio conquistado é meu para sempre. E entre todas as coisas que ganhei nesse curto período de tempo, olhar os olhinhos brilhantes da Nívea, que apenas começa a vida de conquistas, foi a melhor recompensa que essa aventura de escrever samba conseguiu me dar.

O resto? Ah...o resto é consequência.


P.S.: Eis o samba!
http://www.youtube.com/watch?v=9lO6fQAIJ8Q

sexta-feira, agosto 20, 2010

Existe vida após o mestrado!



Quando finalmente escutei a palavra: Aprovada, o que senti foi um alívio imenso misturado a uma sensação de irrealidade que não deixou que eu comemorasse com a emoção que o momento merecia.

Durante dois anos alternei momentos de empolgação com um desânimo intenso. Muita leitura, muitos entraves, muitos problemas em relação ao objeto de estudo e uma crescente sensação de inutilidade, de incapacidade, de insegurança. Escolhi estudar os jovens da comunidade de Manguinhos que fazem iniciação científica na Fiocruz por ser um tema que me apaixona, por paixão mesmo. Mas, uma dissertação de mestrado, não se constrói somente com o trabalho de campo. O fato de não haver na unidade onde fiz o curso, uma linha de pesquisa sobre juventude atrapalhou bastante. O preconceito de uma pesquisadora acerca de pesquisa construída a partir de um estudo de caso aliado a antipatias pessoais, também atrapalhou de certo modo. O fato de eu trabalhar no local que eu pesquisaria foi mais um fator de dificuldade, o sumiço da coorientadora outro...

Porém nem tudo foi tão difícil. Escolhi o melhor, o único orientador adequado a minha pesquisa e ao meu jeito de ser. O Gustavo Matta foi durante todo o tempo o meu porto seguro, para onde eu podia correr quando a pressão ameaçava romper as minhas certezas, quando a vontade de desistir era sufocante ou quando eu precisa somente ver o seu sorriso e ouvir as suas palavras de encorajamento. Perdi a conta de quantas vezes chorei em sua presença e posso afirmar que ele foi fundamental para o meu sucesso. Um amigo...verdadeiramente um amigo.

O grupo focal foi o que mais gostei. Ouvir os jovens, partilhar das experiências deles, saber as histórias de vida e construir o texto com esses dados foi prazeroso e gratificante. E por ser a última coisa a fazer, marcou o início do fim. Com tudo arrumado, a parte metodológica, a parte teórica, as transcrições e o texto sobre as entrevistas e sobre o grupo focal prontos, chegou a hora das conclusões. A parte que eu assinaria a autoria de todas as afirmações que fizesse, a parte onde se soluciona a pergunta que motivou a pesquisa. E aí, travei.

De licença no trabalho para poder escrever, eu abria o computador, olhava a tela em branco e não conseguia escrever uma vírgula. Adoeci, cai de cama e chorava muito. Escrevi o primeiro texto, mandei para o Gustavo e ele devolveu dizendo que não estava bom. Escrevi o segundo, mandei e ele me ligou, disse que eu podia fazer melhor. Recomecei a choradeira, tinha a mais absoluta certeza que não ia conseguir escrever mais nada. Estava cansada de tudo aquilo. Queria pegar um avião, um ônibus, um trem...queria sumir. O tempo passando, a defesa marcada e nada. O Gustavo então resolveu que o último texto que eu havia escrito podia ser aproveitado, não estava bom, mas não tinha mais tempo.

Na véspera do prazo para a entrega, fui dormir triste, uma sensação de fracasso. E aí, aconteceu. Acordei as cinco da manhã, sentei no micro e escrevi 16 páginas. Era como uma represa transbordando, eu escrevia, escrevia, sem parar. Duas horas e meia depois o texto estava pronto. Mandei para o Gustavo e esperei. Quando meu telefone tocou no início da tarde eu sabia que era ele e o que ouvi valeu mais do que o aprovada do final:

_ Era isso que eu esperava de você. Está muito bom. Acabou.

Hoje penso nesse desfecho e agradeço ao espírito iluminado que me inspirou ou "psicografou" o final da minha dissertação.

Enfim, depois de cinco viroses em dois meses, oito quilos a mais e muitas lágrimas a menos, sou Mestre e marquei o dia da defesa com o início de mais um desafio: parei de fumar em definitivo.

E vamos em frente porque meu gosto pelo que é difícil permanece independente da Inez calma que eu gostaria de ser e não consigo...rs

quarta-feira, julho 21, 2010

Sem trazer você pra mim





Hoje eu me fechei entre parênteses
Para não deixar escapar as reticências,
não usar aspas antes e depois do teu nome.
Hoje me flagrei pensando em você
Mais, muito mais do que eu devia
Mas bem menos do que eu queria.
Hoje eu me deixei ficar na escuridão
Esquadrinhando os teus detalhes
Que se recusam a ir embora
Hoje o meu amor quase te alcança
Se eu não seguro ele se lança
Esparrama-se nos teus braços,
Reconhecendo os teus espaços
Hoje a saudade abriu caminho
Rompeu as minhas defesas
da razão fez emoção
E me levou até a cama
Sem trazer você pra mim...


By Inez Sodré - 21/07/2010

domingo, abril 11, 2010

Eu me acostumei






Eu me acostumei a não te ver chegar à minha porta
A varar as madrugadas sem a tua companhia
Ao sumiço do teu perfume nos cantos da minha casa
A dormir sem pensar e a acordar sem chorar

Eu me acostumei a não dizer teu nome toda hora
A viver sem as tuas tantas restrições
A dançar a tua dança sem sentir teu corpo
A fazer planos que não incluíam você

Eu me acostumei a não mais fazer amor
A atender ao telefone e não ouvir a tua voz
A pensar antes de cometer doces loucuras
A não ter mais comigo a luz do teu olhar

Na verdade eu me acostumei
A falta imensa que você me faz
Eu só não consegui me acostumar
A saudade que não tem fim
E que você deixou em mim...



By Inez Sodré - 11/04/2010
Imagem by Regiane Cristina

segunda-feira, abril 05, 2010

Sem olhar para trás







Foi embora sem olhar para trás
Sem ver que na sua partida
Marcava para sempre a minha vida
Se houve arrependimento
Não demonstrou claramente
Em nenhum dia ou momento
Deixou um coração apaixonado
Inconsolável, machucado
E de tal forma conturbado
Que nem pelo passar do tempo
conseguiu ser curado.

Foi embora sem olhar para trás
Sem sequer ver a minha dor
e acabando com a minha paz
Deixou marcas e cicatrizes
Que nem por isso apagaram
As lembranças de tempos felizes
Carregou consigo a alegria
O prazer de fazer amor
E nem o passar do tempo pode
Esquentar minha cama tão fria.

Foi embora sem olhar para trás
Sem o ponto final da ultima conversa
E não voltou nunca mais
O caminho que percorreu
Eu não pude acompanhar
Por mais que o meu pensamento
Estivesse sempre a lhe olhar
Não houve nada no mundo
Que o fizesse voltar.


Inez Sodre - 03/04/2010

sábado, fevereiro 06, 2010

Quem disse?





Quem foi que disse ao tempo
Que ele seria o responsável
Por levar ao esquecimento
Um coração inconsolável?
Quem foi que disse ao amor
Que ele seria imortal
Que nunca viraria dor
Alternando paz com vendaval?
Quem foi que disse a saudade
Que um dia ela iria embora
Que faria da ilusão a verdade
E do passado o agora?
Quem foi que disse a tristeza
Que ela seria passageira
Que nas lágrimas existe beleza
E chorar por amor é besteira?
Quem foi que disse a vida
Que seria fácil vive-la
Com a paz e a alegria
Que é preciso pra mante-la?


By Inez Sodré - 05/02/2010

sexta-feira, fevereiro 05, 2010

A Senhora do Tempo


Se eu fosse senhora do tempo
E pudesse a tudo mudar
Voltaria para aquele momento
Em que parei de sonhar.
Se eu fosse dona das horas
Seguraria os ponteiros
Juntaria as nossas histórias
E dela nos faria prisioneiros.
Se fosse meu o calendário
apagaria dele aquele dia
E no meu mundo imaginário
Seria você que eu teria.
Se eu tivesse esse poder
De não mais te ver partir
Esqueceria o sofrer
De não ter para quem sorrir.
E então quem sabe assim
Numa esquina, numa rua
A alma que fugiu de mim
Deixando minha vida nua
Voltaria a habitar
Esse corpo que largou
Por não querer te abandonar.

By Inez - 05/02/2010

quarta-feira, janeiro 20, 2010

Que não seja eterno?





“Que não seja eterno, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure...”

Pois é poeta, mas o que fazer
Com o amor infindo?
Aquele que resiste a dor,
que não respeita a vontade,
que vive da improbabilidade.
Que não adormece, que não passa.
O que fazer com os dias compridos,
com as noites geladas, insones
O que fazer com a saudade?

Imagino poeta,
que os versos tão lindos que escreveu
foram inspirados em quem
nunca amou dessa forma desregrada.
Em quem nunca chorou a perda
de um sonho, de um homem, da vida.

Em quem acredita no fato
de que um amor se cura com outro.
Mas o que fazer com um coração
que não cede um milímetro
de espaço para um outro coração,
O que fazer com a teimosia, a resistência
de quem não consegue esquecer
e assim vai vivendo tão só
na companhia de suas lembranças.
O que fazer com a chama que não se apaga

O que fazer com a solidão, poeta?

By Inez Sodré - 20/01/2010

Falsa Intimidade - Martha Medeiros







Recebi esse texto hoje e em meio a estudo e lazer de feriado parei para ler atentamente. Gosto do que a Martha escreve. Ela tem a capacidade de ir a fundo nas questões mais delicadas, de cutucar a ferida, de nos fazer rir e chorar. E esse é mais um dos textos nota dez dessa escritora ou descritora da alma feminina.



Chama-se: Falsa Intimidade



Fala-se muito sobre as frágeis relações amorosas de hoje, tão afetadas pela urgência de satisfazer desejos imediatos, pelas inúmeras possibilidades de contato instantâneo e pela pouca durabilidade dos sentimentos. Me pergunto: onde está o furo dessa história? O que perdemos no meio do caminho? Talvez nem tenhamos perdido, talvez simplesmente nunca tenhamos encontrado aquilo que só a poucos casais foi dado viver e que os mantém unidos a despeito de toda a artilharia.

A maioria, hoje, vive suas relações afetivas e sexuais de forma periférica. Contenta-se com cama, orgasmos e satisfação dos instintos. Isso somado a um cineminha, uma escapada no feriadão e um almoço em família configura uma privacidade compartilhada, e é o que basta para confirmar que a relação existe, seja ela chamada de rolo, namoro ou mesmo casamento.

Ainda me pergunto: onde está o furo da história? Por que essa privacidade compartilhada não se sustenta por muito tempo, não satisfaz 100% e gera tantas frustrações?

Com a possibilidade de acesso virtual a uma variedade de candidatos a grande amor e de seus cadastros (idade, profissão, time, fetiches), entrar na privacidade dos outros ficou muito fácil. Porém, em proporção inversa, perdeu-se a noção do que é intimidade, algo que nem mesmo algumas relações duradouras conseguem atingir.

Intimidade não se externa, não se divulga, não se oferece na internet. É nosso bem mais secreto, é onde guardamos a chave do nosso mistério, das nossas dores, das nossas dúvidas, da nossa emoção genuína. Não se compartilha isso com outra pessoa se ela não tiver sensibilidade suficiente para nos ouvir e entender, para nos aceitar e nos acrescentar, para nos respeitar e ofertar em troca sua própria intimidade, selando a partir daí um tipo de pacto que beira o sublime.

Essa intimidade requer confiança plena, compatibilidade na maneira de enxergar o mundo e nenhum instinto maléfico em relação ao outro. Intimidade é quando duas pessoas, mesmo distantes em espaço, estão profundamente unidas porque se reconhecem cúmplices, não competem pela razão. Claro que a intimidade não consegue evitar ciúmes e conflitos de ideias, e tampouco se pretende que ela acabe com a solidão de cada um, que é sagrada, mas ela assegurará a longevidade de uma união que será estabelecida pela generosidade do olhar: se estará mais preocupado em enxergar a alma do outro do que em fiscalizar para onde ele está olhando.

Amigos conseguem essa magia mais do que muitas duplas românticas, que frequentemente se enganam a respeito da falsa intimidade que o sexo faz supor. Invadir a privacidade alheia é moleza, basta um torpedo, um telefonema, um encontro. Mas ter acesso ao mundo interno que o outro habita e sentir-se à vontade nesse mundo é que torna tudo mais raro, mais mágico e mais eterno.