A gente diz não, imagina, eu pago minhas contas, eu participo do processo eleitoral, viajo sozinha, dirijo meu carro, meu corpo e minha vida afetiva, social, intelectual até a morte e a reencarnação se deus quiser e eu acreditar.
Pois bem.
Há controvérsias.
Provavelmente, você pague suas contas. Parabéns! É uma conquista e não é pequena. Não é mesmo.
O que você não se dá conta é de que a maior parte dos homens que exercem a mesma função que você ganham mais que você. Em geral, 30%. E quanto mais qualificado for o cargo, maior fica a diferença.
Ah, você pode ser funcionária pública concursada e estar recebendo o mesmo que o querido que senta a seu lado, portanto, se sente bem feliz. O que você pode não ter percebido é que talvez você ocupe esse cargo e não um mais desafiador, com mais poder e melhor remunerado porque você é mulher e não porque você realmente queria estar onde está.
Explico:
Na hora de se preparar para um concurso, por exemplo, do judiciário, mesmo sendo formada em direito, você prefere concorrer a uma vaga de analista que a uma vaga de juíza.
Por quê?
Se você vai ter de estudar muito de qualquer forma, se você vai abrir mão de sua vida pessoal até ser aprovada, se você vai passar o resto da sua vida nesse batente, por que não almeja, digamos assim, o ponto mais alto?
O ponto mais alto não cabe a uma mulher?
O ponto mais alto tradicionalmente pertence aos homens, portanto, um ponto na pirâmide já está de bom tamanho?
Ou você imagina que não vai conseguir? Que vai ser muito difícil?
Por que não conseguiria?
A resposta é porque você é mulher, e as mulheres, historicamente, foram constituídas como inferiores, para se sentir inferiores e para temer.
As culturas, tanto orientais quanto ocidentais, trabalharam para isso praticamente desde o começo. Deram a largada muito antes da gente poder se declarar, de verdade, civilizada(o)s.
Lá no início, depois da idade da pedra, com a descoberta do cobre, do estanho, do bronze e do ferro, muitíssimo antes da depilação, da chapinha, do rímel, do salto alto, os queridos que agora sentam ao nosso lado, usando o polegar opositor armaram-se e disseram: nós somos o Sujeito único e absoluto aqui da área, logo, vocês, mulheres fora da caverna, são o Outro.
E um Sujeito único e absoluto leva vantagem sobre o Outro desmembrado em zilhões de outros outros, não leva?
E digo zilhões mesmo porque eu, tal qual o José Dias, gosto de exageros e superlativos.
O que eu não gosto é de machismo.
Inconscientemente, nunca gostei.
Mas é difícil se dar conta, é difícil acordar, principalmente, quando a gente nasce e cresce embalada dentro dele.