(eu achava Dia da Mulher meio desrespeitoso com as mulheres em geral. Mas depois achei que não: que num mundo em que a gente ainda tem que lidar com mutilação genital feminina, com mulher ganhar menos que homem pra fazer o mesmo trabalho, com a "dupla jornada" que -- na maioria dos casos -- não é bem dividida, é importante ter pelo menos um dia em que essas questões e outras são discutidas. Melhor seria se em vez de discutir uma vez por ano, o problema fosse atacado todos os dias... Segue textinho mais ou menos sobre isso).
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Porcos
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Tem uns caras por aí (e não são poucos) que me dão vergonha de pertencer ao mesmo gênero. Às vezes parece que quase todos os homens que conheço são uns putos de uns misóginos, assumidos ou não. Deve ser por isso, aliás, que tenho poucos amigos. Uns dois ou três. Todos os outros são conhecidos com quem simpatizo, na melhor das hipóteses, ou que execro, na pior. E mesmo esses com quem simpatizo às vezes soltam umas que não dá para engolir.
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Me revolta, enoja, ver que um monte de carinha por aí fala, fala, fala, bota banca de moderninho, mas, na verdade, acha mesmo que lugar de mulher é em casa. Que mulher não é nada além de uma máquina de fazer sexo, fazer filho, fazer comida, fazer faxina. E nem sei se esses são os piores. Porque também tem aqueles que acham que mulher tem que trabalhar, sim, dividir as contas da casa. E, nas horas vagas, ser máquina de fazer sexo, fazer filhos, fazer comida e fazer faxina. Normalmente são os mesmos imbecis que ligam pra mamãe quando têm uma dorzinha de garganta. E soltam, depois de jantar e nem fazer menção de lavar a louça, "por que você não pede para a minha mãe te dar a receita do tempero dela?". Palhaços.
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Os mesmos proto-humanos que ficam nervosinhos se a mulher tem amigos no trabalho, mas vão pro happy-hour e não param de olhar para a bunda da garçonete, o decote da menina 20 anos mais nova na mesa da frente, as costas da hostess do bar. E trocam com os amigos olhares cúmplices de pseudo-sátiro, como quem quer dar a entender: "se quisesse, comia muito essa aí". E falam dos puteiros que freqüentam (comentário impertinente: vai dar uma trabalheira parar de usar trema), como se pagar uma mulher por sexo fosse prova de macheza.
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Os mesmos babacas, porcos, limitados, que parecem acreditar que o ápice da realização masculina é não ter qualquer interesse ou assunto que não seja futebol ou mulheres de quem jamais irão chegar perto. Que agem como se fosse direito inalienável de uma classe superior olhar para qualquer membro do sexo oposto como se fosse um pedaço de carne. Que reclamam que a namorada está gorda, quando eles mesmos são flácidos, moles, ensebados por dentro e por fora e no cérebro; que reclamam que ela não está depilada, quando eles mesmos fazem a barba para ir ao trabalho (provavelmente esperando que a gostosinha da recepção lance olhos em sua direção), mas, em casa, no fim-de-semana, dão folga para a espuma e a gilete; que reclamam que a casa está bagunçada quando eles mesmos são incapazes de pendurar uma toalha, ou limpar a pia depois de fazer a barba (admitindo, claro, que seja dia de ver a menina da recepção).
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Então chega de enrolação e vamos lá: minhas caras, por favor, aceitem as minhas mais sinceras desculpas em nome de todos nós por essas bestas-feras com quem compartilho mictórios e o "sexo: M" dos formulários. Não desistam da gente: tem alguns que se salvam e, quem sabe, com o tempo, a categoria como um todo não melhora um pouco?
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(mas tem um negócio: vocês precisam ter uma conversa séria com as suas amigas que toleram esse tipo de coisa porque enquanto elas deixarem, eles não vão tomar jeito).
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Allan foi especialmente convidado pela LIZ pela excelente crônica postada no Bar do Escritor no Dia Internacional da Mulher.
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