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sexta-feira, 2 de março de 2018

Adriano Nunes: entrevistando Alberto Lins Caldas, poeta e historiador



Tenho a honra e a alegria de compartilhar, com os amigos, a entrevista intrigante e instigante feita com o poeta e historiador, professor universitário Alberto Lins Caldas, amigo amado:


Entrevista

1) Alberto Lins Caldas, o escritor de densas e significativas imagens, de versos despreocupados com métrica e formalismos gramaticais. Quem é Alberto Lins Caldas? Quem se pensa e sente?

A primeira coisa é q não sou alberto lins caldas. A segunda é q não sou escritor ou poeta. A terceira é q não existe “língua portuguesa” ou “literatura brasileira”. Vamos por partes:

1.      “alberto lins caldas” é uma invenção/necessidade do estado, da família, do costume, da polícia, coisa q serve apenas para imobilizar fluxos, redes em vibração, discordâncias enfaixados num corpo, num nome, em números, em funções, em obrigações e deveres, em orgulho e preconceito, em vaidades e pobrezas. só imobilizado pode ser dominado e cobrado, pode ser punido, responsabilizado, tornado “autor”, “filho”, “pai”, “homem” “brasileiro”, “professor”. jamais me senti sendo um homem ou algo, sendo sujeito ou objeto, mas passagens q encontram passagem, intensidades, loucuras, vertigens: precisamente por isso não sou “brasileiro” nem digo “coisas em português”, não tenho um “sexo”, uma “cor”: uma língua é uma imobilidade, um respeito, redes simbólicas de dominação e impotencialização;
2.      não “sou” escritor ou poeta porq isso seria ser contra a primeira resposta. não assumo como prosa-poesia o escrito q dizem vir de “mim”: apenas deixo q as vibrações simbólicas, signicas, violentas do existir das manadas passem por mim e se expressem, tomem provisoriamente formas q fazem ver o horror q nos rodeia, nos habita, nos perfura e mantem a manada ordeira, trabalhadora e reprodutora. deixo passar, se condessarem, monstruosidades do existir na “máquina tribal”, “nossa” tribo q criou e dominou um mundo;
3.      nada do “escrito por mim” é escrito numa língua, a não ser q se creia possível uma língua, como exige o estado, a religião, a família e seguindo/fazendo essa coisa inútil e monstruosa q chamam de literatura (as palavras codificadas dos senhores/barbárie codificada): literatura exige, como tudo, uma cumplicidade de símbolos, de práticas, de crenças/principalmente de um deus e de palavras de deus ou deuses/ q fazem parte precisamente das formas de existência da máquina tribal (ocidente, cristandade, capitalismo). qualquer língua faz parte dos elementos constitutivos e formativos de servos, de escravos, de trabalhadores, de estados. não tem existência própria, mas existência formativa de servidões: crer numa língua é participar dos processos de servidão, da manutenção do horror, das misérias, dos tolos enganos, da agonia de viver numa desmesurada colmeia campo de concentração;
4.      a “literatura brasileira” não passa da escritura falsa de uma fantasmagoria de senhores e servos (brasil, q não existe, não tem um povo, uma constituição feita por esse povo, não tem cidadãos): é apenas a mais pura expressão do nada dizer, da inutilidade de dizer, do dizer sem pensar: uma forma fraca de fascismo literário;

2) Diga-nos um pouco da sua trajetória literário-acadêmica. Que livros já foram publicados? Quais sites em atividade? Como o ofício de professor de História influencia o poeta? Quando se deu a descoberta de que era preciso escrever versos? Quando se deu a consciência reflexiva de que você era/é poeta?

1.      nunca fui “professor”. pra ser professor seria preciso crer na educação, na cultura, no aprendizado, no melhoramento com os instrumentos da barbárie, ou melhor, os instrumentos q preparam escravos para se deixarem roubar naquilo e só naquilo q “possuem”, força de trabalho: a educação é o mais perverso, falso e deformador instrumento da máquina tribal: sua única função é preparar carne pra ser abatida no mercado, torcer o corpo até q ele faça o q é preciso no mundo do trabalho;
2.      pra mim universidade, enquanto “professor”, tentar abrir linhas de força, sempre foi um lugar de não aprendizagem, mas de desformatação, multiplicar e dissolver formatações: se “fui professor” sempre fui assim para o estado, a universidade, as redes imóveis do horror: sempre fiz o q essa barbaria jamais poderia esperar, lutar contra ela cada segundo: inutilmente – não há senhores, uns poucos, sem milhões de servos, de cumplices. a luta contra o horror é absolutamente inútil. Depois de 40 anos de sala de aula, sei q alunos querem apenas aprender porcamente para o mercado, a triste reprodução do mesmo;
3.      daí por uma “relação entre ser professor e poeta” só pode ser impossível: nunca houve professor (sem “sierras maestras”, só resta a sala de aula), jamais poeta. a luta com a escrita contra o horror, literariamente, só pode ser um engano de quem lê: não há ali nenhuma poesia, nenhum verso, apenas um texto q chamo “poema” como arma de exposição dos fragmentos do horror. cada leitor vai ler o q desejar, o q acreditar, o q pensa – jamais, como os alunos, dando origem a um pensamento, uma ação contra o horror, contra a máquina tribal. dessa maneira, não sou poeta, jamais me descobri poeta. sempre, desde a infância, foi feito uma guerrilha contra o existente como um todo: a forma q isso toma, depende de vários fatores, como leitores (os piores servos por acreditarem na escrita, na literatura, o imóvel, na respeitabilidade), editoras, universidades, amigos e inimigos.


3) O que é, para você, a ars poetica? Como você vê esteticamente um poema? É o poema um objeto estético, uma finalidade sem fim? Um poema tem ontologicamente capacidade de salvação?

  1. não existe “ars poetica”: para isso é preciso acreditar em coisas demais, em coisas “verdadeiras” e “falsas”, em leis, ordens, argumentos, fala, escrita, história e natureza (esses conceitos matam todo dia, toda hora, mulheres, gays, negros, pobres, lesbicas e tudo q parece fraco e não fazer parte): todo um arsenal, uma muralha, uma catedral – construções para q todas as imobilidades sejam o q dizem ser: “ars poetica” é mais um instrumento de imobilização e integração;
  2. um poema não pode ser visto esteticamente: apenas porq pode e deve ser visto, antes de tudo, politicamente, eticamente, é q pode ser transversalmente pensado esteticamente, mas a “beleza” esta comprometida demais com a imobilidade para ser devidamente relevante;
  3. toda arte, todos os elementos das artes, são bobices pra alegrar aos senhores. os artistas não passam de bobos da corte. a pergunta: “é o poema um objeto estético, uma finalidade sem fim” nos deixa no centro daquele pensamento q, sem saber, expos a arte a sua mais crua inexistência, a sua mais cruel forma de se exercitar, q é ser um dos divertimentos sem “finalidade” dos senhores (a “finalidade” é entorpecer ou criar ser vos orgulhosos), o pensamento de kant, q tornou a arte o q ela sempre foi, tolices pra formar tolos trabalhadores. nenhuma obra de arte consegue ser mais q “divertimento de marionetes num teatro de sombras”;
  4. precisamente por sua condição circesca, coisa de bufonaria, de inútil-inutilidade, a arte é o “ser”, o imóvel, o eixo, deus/estado/fábrica, o “centro” patético dos labirintos do capital, da burguesia, do capitalismo, uma fantasmagoria no centro das fantasmagorias (marx, benjamin, agamben). lugar de exposição do ridículo desse lugar, da ridícula inutilidade desse lugar.

4) O que importa no poema? A beleza importa em que sentido? O que é então um belo poema? As convenções têm validade estética quando delimitam cânones?

  1. o q importa seria a consciência do fragmento do horror, o narrador (personagem q fala o poema), abrindo os olhos do pensamento sobre o existente: mas essa “missão” é inútil. ela não acontece. o poema é apenas um resto de ação inútil num mundo onde isso não passa de impotência real de lutar. o poema inda ta preso a tudo q ele quer combater. serve aos senhores, a coleta da força de trabalho da mesma maneira. criando, fazendo parte da mesma coisa fria e ridícula da arte em geral, não uma “arma de guerra” como se pretende, um instrumento de ação.
  2. dai porq a beleza é a visibilidade da impotência, sua perversa e simétrica gozação. um “belo poema”, q não passa de um verso, não passa de uma arma quebrada, ou um verso de marionetes, os poetas, pra seus senhores passarem a página com a certeza do “reconhecimento” de classe q torna cada um deles um diferente, alguém q conquistou um lugar: o “poema”, na verdade sempre verso, é apenas uma armadilha, uma ilusão da vontade de ascensão e reconhecimento;
  3. só existem cânones pro gozo perverso das convenções, do estado, da nação, da vontade de imobilidade e dominação;

5) Quais influências poéticas marcaram a sua infância poética? Como se deu a construção desse poeta atual através das leituras de poemas alheios? Que poeta há mais no poeta Alberto?

  1. o q nasce de poetas e versos são poetas e versos: poemas nascem de um constante e vivenciam enfrentamento do horror, não nascem de livros, mesmo podendo usar carcaças, pedaços de livros de todos os tipos: os poemas se dão duma maneira diferente: apenas jorram dos fluxos de linguagem: aqui cessa borges e começa marx;
  2. nenhum poeta me marcou ou marca, mas alguns filósofos como marx, espinosa, hegel, nietzsche, foucault, deleuze, bachelard, blanchot, barthes: a literatura apenas enquanto caixa de instrumentos para testar ideias e sensações; porisso não carrego nas costas nenhum poeta, isso quem faz é o leitor e projeta no poema, não conseguindo ler esse poema com a devida precisão, cuidado, pensamento e ação.

6) Poesia como arte e como mercado? O que devora o quê? Por que é importante ler livros de poemas?

  1. nenhuma importância ler livro algum, principalmente de poesias. são integrados demais para valer a pena. poesia, arte, livros não passam de produtos do mercado e não algo além dele, algo q possa fazer compreender o q seria o próprio mercado. aqueles “livros” q escapam a isso terminam fazendo parte e entrando na dança.

7) Os clássicos são insuperáveis? Tendemos a superá-los?

  1. “clássico” é o q mantem a tribo com seus pilares imaginários, suas certezas, domínios nos lugares bem colocados. eles são os pregos dos tecidos das teias simbólicas tornadas realidade, naturalidade. sem deus, estado, família, língua, povo não existe “clássico”, q é um dos elementos necessários de estabilização, reconhecimento e identidade;
  2. clássicos pulam os círculos de modificação social para garantirem novos reconhecimentos, identidades, respeitos e naturalizações – continuidades: daí a sensação de não serem superados: eles são marcos de qualquer boa ditadura do único, do mesmo, do igual q quer aparecer diferente.

8 ) Como desmascarar o horror, como desnudá-lo e expô-lo ao público? Por que o horror choca e escandaliza? Por que o horror é medida humana? Há poesia no horror? Como a poesia atua na denúncia do horror?

  1. nada mais evidente q a maquina tribal, parafraseando o nada mais evidente q deus ou substancia de espinosa. precisamente por isso ela não pode ser exposta a não ser em pequenos fragmentos, o q precisamente impossibilita um desmascaramento, só possível em quem esta numa totalidade monstruosa onde a maquina tribal inteira se joga na destruição do outro: só assim ela pode ser desmascarada: ou parcialmente desmascaradas naqueles q dentro da maquina tribal é tratado a vida inteira como um monstro, uma exceção, uma cois a parte da natureza, da beleza. expor o horror seria descrever, seria representar, seria fotografar e isso apenas seria nada mais q o próprio horror se escondendo, se tornando superfície, visibilidade, apenas um momento, um traço, quando nada é mais evidente q o horror, isto é, tudo é ele, precisamente tudo;
  2. o horror q choca é apenas o individualizado, o q pode ate ser mudado, o feito pelo monstro ou por um momento de uma tribo: sem ser visto em sua plenitude ele não pode chocar, nem ser sabido, nem ser mudado;
  3. o conceito de “humano”, “humanidade”, “homem” é o mesmo q “natureza, “sociedade” “raça”, “gênero”, “universalização”, etc, q não passam de conceitos q fazem parte de todos os tecidos do horror: esses conceitos são instrumentos vivos do horror da maquina tribal, principalmente pra dominar, excluir, explorar, desmoralizar e destruir. todos esses conceitos-vivencias só existindo como instrumentos de dominação e exploração (não existindo raça não pode haver racismo e com isso se esconde a essência nazista da máquina tribal; não existindo macho/fêmea podemos esconder essa essência como se fosse uma briga de diferenças; não existindo heterossexual/homossexual se esconde q a questão não é “natural”, porq não existe “natureza”)/ redes imaginarias, ficcionais, simbólicas, todas crenças nazistas de funcionamento, separação, produção, reprodução: garantias da normalidade.
  4. a poesia “não atua contra”, ela faz parte do horror e sempre fez, principalmente nesses 200 anos (romantismo, modernidade) onde o capitalismo se tornou a única realidade, a única ordem: o poeta é um fujão dessa tribo nazista q criou um mundo nesses pouco mais de 500 anos. sua função é esconder com a simetria e a beleza, com a norma e a língua precisamente a essência nazista do “nosso existir”.

9) Quando o artista trabalha com a realidade fatual, em poesia, com a política, por exemplo, corre o risco de ser panfletário ou mesmo um ideólogo. Como evitar isso? Ou não importa? A poesia aceita e legitima quaisquer discursos sob a alegação de que tudo é poético?

  1. essa é uma questão geral q diz respeito a poesia, o q não é meu caso. acho q responderia melhor um poeta sobre seus versos e a politica;
  2. quanto ao poema ele é, sempre, de esquerda, libertino, libertário, livre, guerrilheiro, uma arma provisória: sua essência é a luta contra o existente. ser panfletário ou ideológico diz respeito ao poeta, a poesia e a literatura enquanto “escrituras falsas” da-nação.

10) Como delinear e decidir que um objeto estético pode ser considerado uma obra de arte?

  1. essa é uma questão q diz respeito a uma disciplina, a estética, deformação filosófica do pensar as coisas enquanto igualdade e não enquanto diferença e multiplicidade: por exemplo, não existe “obra de arte” no centro da estética porq essa seria de cada grupo e cada tribo, não podendo haver mais um universal, o q deformaria e esvaziaria seu sentido: apenas universal a “obra de arte” poderia ser pensada, logo, negada e posta, “inconscientemente” enquanto “obra de arte” pra maquina tribal.

11) Todo aquele que faz versos é poeta? Harold Bloom diz que há poetas e versificadores. Como você enxerga essa perspectiva?

  1. mais uma vez, essa é uma questão de poetas (faz versos, faz poesia), não de poematas (faz poemas). Tanto poetas quanto versificadores tão no mesmo lócus, mesma perspectiva, mesmo sistema de crenças.

12) Como o poeta vê o Brasil atual? As instituições funcionam democraticamente? O fascismo está ganhando forças? Por quê? A poesia pode ser corrompida e atender a objetivos ideólogos ou mesmo nefastos?

  1. não existe nem jamais existiu “brasil”, país, povo, leis, sociedade, história, cultura, civilização, isso “brasil”: essa generalidade, esse global, esse universo “brasil” (já inexistente por sua universalidade de existência querendo abarcar numa unidade e identidade as inumeráveis formas do mesmo: o cada-um fazendo o torno “brasil” girar e funcionar) sempre foi feito pela “servidão voluntária” do imenso cardume, lixeiro, chorume – agregados, funcionários, empregados, servos, trabalhadores – uma coisa média, uma alma pequena, uma coisa servil (“alma brasil”): “brasil” é a fantasmagoria pesadelo “inicial” do capital mercantil, não dum grupo, uma casta, uma rede financeira-industrial, dum povo: específica junção/articulação entre servidão-voluntária-classes-dominantes é apenas parte do visível, do permitido, do quase sabido: a coisa, o isso, é mais simples e por isso mesmo se escondeu normalmente, naturalmente, socialmente: só há servidão voluntária e seus fantasmas (sua rede de crenças, uma normose) se entendermos esse voluntário enquanto um não sabido involuntário, um consciente sabichão, agregado com subclasses mamando o produzido por essa servidão voluntária), “inconsciente”, um não dito porq não plenamente sabido, aproveitado, feito segundo a segundo em práticas, crenças, desejos, saberes, experiências e sonhos, mas não sabido – servido sabido aos “senhores”: o espectro projeto martitica (“brasil”), o quase reprimido porq não se viveu, é vivência construída dia a dia pela servidão voluntária: “brasil” é o aparecer crente, o construído, a visibilidade de martitica, a polpa q se apalpa sem ser e não se apalpa quase sendo, esse nada, o permitido, o aceito, a ponta, a pele do espectro mantido, reproduzido e guardado pela servidão voluntária como se fosse;
  2.  se há o “brasil” há o “povo brasileiro” – mas não há “povo” algum porq um “povo” se faz com uma ou várias revoluções onde uma massa, uma “plebe” indigesta e cordeira, “passa a se reconhecer e lutar em comum”: no “brasil” (matrix de martitica, fantasmagoria monstruosa, carnaval onde a “plebe” imita os senhores, os sonhos e desejos dos senhores) jamais houve revolução nem pode haver enquanto houver o “brasil” enquanto pele dobrada de martitica, a pele, a polpa do nada, o projeto dos senhores tornado quase realidade, quase vivido, quase gente, transe entre fantasmagoria e existência – uma forma de existência como a dos centauros, de gregor sansa ou k.): apenas depois de revoltas, resistências, revoluções uma massa bruta, cordeira, se torna “povo” e pode e tem o poder de fazer suas leis, ele mesmo, sua constituição, feita por ele, por sua coragem depois de muito sangue onde foi visto q “agora e daqui pra diante podemos”, logo, o “povo” se torna “cidadão”, nasce a coragem e a confiança em sua força e poder, q se tona ponto de partida dum “viver social”: no “brasil”, matrix de martitica, jamais houve um “cidadão”, jamais houve leis, jamais uma constituição, jamais um país, jamais liberdade alguma, sociedade, cultura: as identidades (“brasil”, brasileiro, território nacional, literatura, arte, costumes, branco, negro, macho, senhora, etc.) são apenas biombos construídos pelas servidões voluntárias (imitações das “metrópoles”) e seus instrumentos ou dispositivos como a educação, por exemplo (essa coisa sempre falsa, sempre farsa, sempre útil ao “projeto martitica”, sempre “cúmplice”), pelas mídias, pelas crenças, pelos discursos, pelas práticas mantenedoras, pela literatura (letra falsa, oligarquia das letras, realismo de botequim, crônicas, memorialismos, sociologismos: escritura falsa): “aceitamos e obedecemos”: “mantemos os sonhos dos senhores”: “agiremos como se fosse e terminará sendo”: “mentiremos tanto q se tornará verdade: brasil”: mas não se sabe disso: o “brasil” como cenário perverso, nazista, campo de extermínio, onde os “primeiros senhores” deixaram de atuar e entregaram a outros senhores e outros senhores e mesmos senhores uma matrix, um cenário, atores, palhaços, cretinos, trabalhadores e defensores dessa péssima opera bufa “brasil” q criou seus próprios senhores e cuidam deles com deleite cordeiro: esse cuidado dos cordeiros com seus lobos, q são cordeiros com postura de lobo, é uma das forças bufas da fantasmagoria “brasil”: parece política e não passa de teatro de quintal;
  3. O “brasil” sempre foi um rosário de ditaduras e a literatura apenas letra falsa e reza pra esse rosário.

13) Como você percebe a relação entre poesia e crítica?

  1. inútil e ridícula. na verdade, uma relação obscena porque esconde q nada uma tem a dizer a outra ou q uma nasça da outra: é preciso q se acredite q as palavras de um deus criem livros, nasçam de autores, q possam ordenar e vir de ordenações: apenas uma grande vergonha teológica.

14) Como você encara a discussão poema e letra de música?

  1. simples: uma tolice cercada de música, q é outra tolice e uma tolice sem música se é um poema a música nada acrescentará ou retirará. nada mais a dizer.

15) Se tivesse que nomear escritores não poetas (ou mesmo obras em prosa), quais são fundamentais para o poeta Alberto?

  1. tenho com os livros uma relação diferente da maioria: não entendo como algo a ser seguido ou q com ele se aprenda algo, mas um lugar de luta, de roubo, de saque, de construção das minhas armas em minha luta. todos os livros são insuficientes pra uma luta contra o horror, uma guerra presente, política, ética. eles não são objetos de prazer, mas de depósito de possíveis balas, pólvoras, lanças, flechas, tacapes, fuzis, pedras. mas nada disso é certo. eles não são daqui e dagora. são apenas instrumentos possíveis. a lista abaixo é o de um arsenal já usado, já gasto e reusado. uma rede conhecida mínima pra luta dagora. nada quanto a "grandes livros e grandes autores". eu detesto livros. acho uma coisa desprezível, um artefato limitante. é por isso q não há nada da "língua portuguesa": essa coisinha do senhor encravada na carne, impotente e sem arsenais realmente violentos e radicais. o resto se dirá com a vida.
  2. segue uma antiga lista (nada, jamais, da “língua portuguesa”), sem ordem pessoal, de obras e autores q são a base mínima do meu solo literário (solo construído pra ficar em pé e poder escrever segundo minha perspectiva): ao redor e além centenas de outros autores e livros cada um enfrentado conforme o tipo de batalha.
  3. Livros e Autores: O Mestre e Margarida – Bulgákov; Jakob von Gunten – Walser; Otelo – Shakespeare; As Brasas – Marai; Juventude – Conrad; A Metamorfose – Kafka; Todas as Manhãs do Mundo – Pascal Quignard; Silvia – Nerval;  O Perfume – Suskind; Viagem ao Fim da Noite – Céline; A Casa das Belas Adormecidas – Kawabata; Memória de Minhas Putas Tristes – Garcia Márquez; O Barão nas Árvores – Calvino; À Espera dos Bárbaros – Coetzee; O Sobrinho de Rameau – Diderot; Um Médico Rural – Kafka; O Jovem Törless – Musil; Morte em Veneza – Mann; O Náufrago – Bernhard; A Tentação de Santo Antônio – Flaubert; O Imoralista – Gide; Breve Romance de Sonho – Schnitzler; Bartleby – Melville; Hamlet – Shakespeare; Woyzeck – Büchner; Baal – Brecht; Memórias do Subsolo – Dostoievski; Édipo Rei – Sófocles; Crônica de uma Morte Anunciada – Garcia Márquez; Odisséia / Ilíada – Homero; O Visconde Partido ao Meio – Calvino; Billy Budd – Melville; O Penitente – Singer; O Veredicto / Na Colônia Penal – Kafka; Macbeth – Shakespeare; O Desaparecido – Kafka; Palomar – Calvino; No Coração das Trevas – Conrad; Michael Kohlhaas – Kleist; Os Últimos Dias de Immanuel Kant – Thomas de Quincey; A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock – Eliot; Ricardo III – Shakespeare; O Velho e o Mar – Hemingway; Morte a Crédito – Céline; O Duelo – Conrad; O Declínio do Egoísta Johann Fatzer – Brecht; Retrato do Artista Quando Jovem – Joyce; Ficções – Borges; O Castelo – Kafka; Alice / Alice Através do Espelho – Carroll; Histórias Extraordinárias – Poe; As Cidades Invisíveis – Calvino; Contos – Voltaire; O Deserto dos Tártaros – Buzzati; Conversa na Sicília – Vittorini; Novecentos – Alessandro Barico; As Flores do Mal – Baudelaire; O Nome da Rosa – Eco; As Mil e Uma Noites; O Processo – Kafka; Ulysses – Joyce; Em Busca do Tempo Perdido – Proust; Omeros – Walcott; Ana Karenina – Tolstoi; Jacques, o Fatalista e seu Mestre – Diderot; Madame Bovary – Flaubert; Gargântua / Pantagruel – Rabelais; Aventuras do Bravo Soldado Schweik – Hasek; Dom Quixote – Cervantes; Divina Comédia – Dante; O Parasita – Luciano; Terra Desolada – T. S. Eliot; Rei Lear – Shakespeare; Moby Dick – Melville; Danton – Büchner; Hadji Murat – Tolstoi; O Livro de Areia – Borges; Um Artista da Fome – Kafka; Auto-de-Fé – Elias Canetti; O Pequeno Zacarias – Hoffman; Balada do Velho Marinheiro – Coleridge; Grandes Esperanças – Dickens; Clube da Luta – Chuck Palahniuk; Ferdydurke – Witold Gombrowicz; Homem Invisível – Ralph Ellison.
  4. Em guerra: Mary Shelley; Tchekhov; Cortázar; Beckett; Ibsen; Duras; Beauvoir; Anaïs; Virginia Woolf; Kundera; Balzac;Austen; Agatha; J. K. Rowling; Heiner Müller; Sófocles; Pirandello; Gogol; Dorothy Parker; Katherine Mansfield; Swift; Sterne; Defoe; Lezama; Isabel Allende; Marguerite Yourcenar; Cabrera Infante; Ionesco; Montaigne; Moliere; Toni Morrison; Anne Rice; Aristofanes; Svevo; Sade; Dostoievski.
  5. Poemas de: Seferis; Corbiere; Gertrude; Dickinson; Rimbaud; Ducasse; Celan; Akhmathova; Enzensberger; Benn; Lorca; Donne; Ingeborg; Hopkins; Safo; Heine; Szymborska; Pound; Elizabeth Browning; Ginsberg; Cummings; Milton; Villon; Plath; Brecht; Carlos Williams; Rilke; Stevens; Bukowski; Marina Tsvetaïeva; Donne; Bishop; Juana Inés de la Cruz; Kaváfis; Sexton; Creeley; Whitman; Hopkins; Marianne Moore; Lautréamont; Yeats; Mallarmé; Laforgue; Laura Riding; Quasimodo; Hölderlin; Auden; Trakl; Montale; Guido Cavalcanti; Blake; Arnaut Daniel; Catulo; Virgílio; Ungaretti; Vasko Popa; Nelly Sachs; Óssip Mandelstam.
  6. Filósofos essenciais a esse solo literário: Heráclito, Platão, Aristóteles, Agostinho, Maquiavel, Hobbes, Descartes, Espinosa, Rousseau, Diderot, Kant, Shelling, Hegel, Marx, Nietzche, Freud, Benjamin, Blanchot, Barthes, Foucault, Lacan, Deleuze, Agamben, Rancière.

16) Seus poemas têm uma forte relação com o conceito de tribo/clã, ao que parece. Isso se dá por causa de suas convicções acadêmicas e políticas? Até que ponto o  historiador transparece no poeta enquanto arauto da civilização? Somos civilizados ou bárbaros?

  1. como disse antes, fui professor de história e filosofia por 40 anos pra ser contra a imobilidade das coisas, não pra ensinar. a história jamais existiu. não passa de uma mega construção imaginaria para garantir a identidade da produção, dos servos e das naturalizações. daí não haver nenhuma relação entre poemas e “história”, mas uma pequena relação entre os poemas e a luta contra o horror e a “história” enquanto um dos seus elementos.
  2. “civilização” e “barbárie” são componentes da mesma visão de existência da história. duas inexistências inúteis por não poderem dar conta de nada, nem mesmo do q ascene ou cai, relativismos num fluxo múltiplo e violento;

17) Que poetas e livros anda lendo Alberto Lins Caldas?

  1. sempre os mesmos há muitos anos: os da pergunta 15.

18) Por que a culinária é um traço forte em seus escritos? Que relação há entre a denúncia do horror e a culinária?

  1. a culinária, as coisas, os corpos são matérias repetidas tanto num mesmo poema quanto em estruturas de poemas. assim como as mesmas palavras, a mesma pobreza de palavras: sem estar na “literatura brasileira”, a pobreza faz parte constitutiva por ser ela sempre a mesma: mesmo quando o narrador é um fascista (o q é normal mesmo quando não parece) essa pobreza, essa repetição esses elementos culinários tornam esses narradores “animais”, “aquilo q come e só come”, a redução de tudo ao q é devorado.

19) Que poetas contemporâneos são, para você, grandes poetas, isto é, que impressionam o poeta Caldas?

  1. sem poetas. todos integrados, todos funcionários, todos fazendo parte da-nação, no brasil martitica, a ilha brasil dos colonizadores, quanto em outras línguas ocidentais e nenhuma violenta revolução em línguas, em povos q foram colonizados, escravizados, destroçados; humilhados: a poesia não redime nem faz revoluções. a poesia faz parte do horror.

20) Há esperanças? Há Deus? Há o instante em que a existência pode ser comemorada sem rancor ou ódio?

  1. sem esperança nenhuma, nem para “nós” nem para “eles”/ sem deus, sem natureza, sem sociedade, sem comunidade, sem a possibilidade da comunicação, sem o amor (invenção reprodutiva quando enfraqueceu e cessou o pátrio poder no ocidente, o poder q casava), sem a amizade, o existente apenas como formas do ressentimento, rancor e ódio, a essência do capitalismo, nazista há mais de 1000 anos, nada há q possa ser comemorado: a alegria é apenas um conceito fraco diante do horror;

21) Você também traduz. Que idiomas costuma traduzir e quais obras já foram por você  traduzidas?

  1. Desde 1988 (quando passei a entender as existências da maneira da “máquina tribal”) fui perdendo as línguas e me dedicando a escapar do português, língua q detesto e me sinto mal quando ouço, principalmente de portugueses;
  2. Nunca traduzi nenhuma obra. Eles não precisam disso. O caminho seria a tradução do brasileiro, do poema, da diferença radical ser traduzida pra eles, q inda pensam e escrevem em mundos ridículos, imóveis, voltados pro dinheiro e pra verdade q matou bilhões de pessoas nesses 500 anos no mundo inteiro.

22) Uma citação. Um livro de cabeceira. Uma canção.  Um filósofo. Um historiador. Um lugar. Uma comida. Um tempo/era. Um desejo. Um medo. Uma alegria. Um amor.

  1. os livros aqueles lá de cima, mas nenhum de cabeceira;
  2. nenhuma canção: considero a música a mais perfeita forma fascista de arte: ela nada significa e se mostra como se fosse o supremo, o pleno, a essência: delírios fascistas compreensíveis;
  3. a “linhagem” de filósofos acima: heráclito, platão, aristóteles, agostinho, maquiavel, hobbes, descartes, espinosa, rousseau, diderot, kant, shelling, hegel, marx, nietzche, freud, benjamin, blanchot, barthes, foucault, lacan, deleuze, agamben, rancière;
  4. nenhum historiador. todos eles não passam de servos imobilizadores de uma coisa q é apenas o q se dissolve do existente, jamais da história, uma ficção ridícula pra imobilizar os fluxos do existente;
  5. nenhum lugar. não gosto dos lugares, apenas são dimensões a serem atravessadas;
  6. comidas: qualquer uma: quem já passou muita fome, quem já comeu comida do lixo, não terá jamais uma comida preferida, apenas q haja comida;
  7. nenhum tempo: o tempo é o q se esfarela sem se ver do existente;
  8. nenhum desejo, ou apenas uma certa vontade de morrer, pois já estou velho e tudo doi e tudo cansa pra nada;
  9. nenhum desejo, nenhum medo, nenhuma alegria, nenhum amor: apenas a vida enquanto não cessa.

*

essas ideias estão espalhadas em livros e artigos desde o começo da década de 80 até o ano passado 2017 (quando me aposentei e fugi pra viver em paris antes de ser assassinado por-nada nessa última ditadura), quando deixei de escrever a “escrita de ideias” e fico mais desaparecido vendo aparecer narradores livres e plenos dizendo seu horror, o horror nos poemas.



Alberto,muito obrigado!
Adriano Nunes

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Adriano Nunes: lançamento do livro "Antípodas Tropicais"

Evento: Lançamento de "Antípodas tropicais" de Adriano Nunes. Editora Vidráguas

Dia 28/5/2014, às 11 horas 
Editora/Livraria Edufal. Campus da Universidade Federal de Alagoas







" Ao ler, em Antípodas tropicais, poemas em que admiravelmente convivem espontaneidade e virtuosismo, invenção e técnica, ousadia e erudição, inteligência e sensibilidade, fiquei feliz de poder não apenas confirmar, mas reforçar, minha convicção de que se encontra, em Adriano Nunes, um poeta contemporâneo que faz juz à melhor tradição da poesia brasileira."

Antonio Cicero


Se fosse um verso, Antípodas tropicais teria  sete sílabas. E é no andamento do verso curto que Adriano Nunes, neste novo livro, alcança excelentes  resultados. Nele avulta a rigorosa consciência da forma não apenas em seus sinais externos – a  consistente prática do  soneto, por exemplo – mas no domínio rítmico, na amplitude vocabular. Tudo isso, porém, ao largo do mero virtuosismo, pois Adriano conjuga a técnica a um efetivo e intenso temperamento lírico-meditativo, na insaciada  e inestancável  busca do outro, ainda que esse outro resida no próprio eu. A metalinguagem, que em muitos poetas se restringe a receitas domesticadas, em Antípodas tropicais  comparece viva e vigorosa, lançando-se sem cessar  ao “precipício de sentidos”,  destinação derradeira de todo poema. “

Antonio Carlos Secchin




"É impressionante a desenvoltura com que Adriano Nunes passeia pelo amplo repertório de formas, sempre com competência e intimidade no trato com a linguagem, mantendo ao mesmo tempo uma voz própria, original, cheia de belos achados."

Arnaldo Antunes

"Passeando com intimidade e destreza por diferentes ritmos e tons de discurso - da austeridade clássica à coloquialidade modernista, do metro preciso ao verso livre e deste às experiências mais construtivistas - , Adriano Nunes parece uma síntese impossível entre o poeta lírico e o formalista. De suas rimas raras, aliterações e inversões sintáticas, salta sempre uma surpresa, uma solução imprevista, um deslumbre sonoro-semântico que potencializa a linguagem."


Arnaldo Antunes.