Há mais de
15 anos, publiquei um artigo com o título “Rejuvenescer como águias”. Relendo
agora aquelas reflexões, me dei conta de como elas são atuais e adequadas aos
tempos maus sob os quais vivemos e sofremos. Retomo-as e aprofundo-as para
alimentar nossa esperança, enfraquecida pelas ameaças que pesam sobre a Terra e
a humanidade. Se não nos agarrarmos a alguma esperança, perderemos o horizonte
do futuro e correremos o risco de nos entregarmos ao desamparo imobilizador ou
à resignação estéril. Lembrei-me de um mito da antiga cultura mediterrânea
sobre o rejuvenescimento das águias. De tempos em tempos, reza o mito, a águia
se renova totalmente. Ela voa cada vez mais alto até chegar perto do sol.
Então, as penas se incendeiam, e ela toda começa a arder. Quando chega a esse
ponto, ela se precipita do céu, se lança qual flecha nas águas frias do lago, e
o fogo se apaga. A velha águia volta a ter penas novas, garras afiadas, olhos
penetrantes e o vigor da juventude. Esse mito constitui o substrato cultural do
salmo 103, que diz: “O Senhor faz com que minha juventude se renove como uma
águia”.
Para
entender esse relato, precisamos revisitar Gaston Bachelard e C. G. Jung, que
entendiam muito de mitos e de seu sentido existencial. Segundo sua
interpretação, fogo e água são opostos, mas, quando unidos, se fazem poderosos
símbolos de transformação. O fogo simboliza o céu, a consciência e as dimensões
masculinas. A água, ao contrário, a terra, o inconsciente e as dimensões
femininas.
Passar pelo
fogo e pela água significa, portanto, integrar em si os opostos e crescer na
identidade pessoal. Ninguém, ao passar pelo fogo ou pela água, permanece
intocado.
A água nos
faz pensar também nas grandes enchentes. Com sua força, tudo carregam,
especialmente o que não tem consistência e solidez. São os infortúnios da vida.
E o fogo
nos faz imaginar as fornalhas que queimam e acrisolam tudo o que é ganga e não
é essencial. São as notórias crises existenciais. Quem recebe o batismo de fogo
e o de água rejuvenesce como a águia.
O VELHO E O
NOVO
Isso
significa entregar à morte todo o velho que existe em nós para que o novo possa
irromper e fazer o seu curso. O velho em nós são os hábitos e as atitudes que
não nos engrandecem. Em outras palavras, significa morrer e ressuscitar.
Rejuvenescer
como águia significa, também, desprender-se de coisas que um dia foram boas e
de ideias que foram luminosas, mas que, lentamente, se tornaram ultrapassadas e
incapazes de inspirar um caminho para o futuro. A crise atual perdura e se
aprofunda porque os que controlam o poder têm conceitos velhos, incapazes de
oferecer respostas. Rejuvenescer como águia significa ter coragem para
recomeçar e estar sempre aberto a escutar, a aprender e a revisar. Não é isso a
que nos propomos a cada novo ano?
Que o ano
de 2013, recém-inaugurado, seja oportunidade de perguntar o quanto de galinha
existe em nós e que não quer outra coisa senão ciscar o chão, e o quanto de
águia há, também, em nós disposta a rejuvenescer ao confrontar-se valentemente
com os tropeços e as crises da vida e buscar um novo paradigma de convivência.
E não
podemos esquecer aquela Energia poderosa e amorosa que sempre nos acompanha e
que move o inteiro universo. Ela nos habita, nos anima e confere permanente
sentido de lutar e de viver. Seu nome é Spiritus
Creator, que nunca nos pode faltar, senão, perdemos a vitalidade e a
esperança.
Fonte: Blog MomentoBrasil.