O QUE VOCÊ FAZ É SEMPRE BEM FEITO
De Hans Christian Andersen (1805 – 1875)
"Quem visitou os campos dinamarqueses terá visto muitas casas de camponeses com teto de palha. Sobre o teto cresce o musgo e, no musgo, faz ninho a cegonha. As janelas são baixas e o forno ressalta da parede como uma pequena barriga redonda. Em volta da casa corre uma sebe de sabugueiro, e a poucos passos de distância há uma poça d'agua onde se agitam os patos.
Era uma vez uma casa de campo justamente como aquela. Ali moravam dois velhos camponeses, marido e mulher, que se estimavam muito. Eram muito pobres, mas possuíam um cavalo, que pastava no campo. O cavalo servia ao marido quando este queria ir à cidade, e também era emprestado aos vizinhos em troca de pequenas compensações.
- Não seria melhor vende-lo ou trocá-lo por um outro animal que renda mais dinheiro? Perguntou um dia o camponês a sua mulher.
- Faça o que quiser – respondeu ela. Hoje é dia de feira na cidade. Você pode vender o cavalo ou trocá-lo bem.
Ela escovou com grande cuidado os trajes do marido, amarrou-lhe o lenço ao pescoço e:
- Boa viagem e boa sorte! – lhe disse, acompanhando-o até a porta.
O camponês saltou na sela do cavalo e partiu assobiando alegremente. Fazia um calor tremendo e o velhote enxugava o suor e tinha sede. Ao longo da estrada encontrou um homem que conduzia uma belíssima vaca.
"Se aquela vaca fosse minha – pensou ele – eu e minha velha poderíamos beber um copo de leite todos os dias". Então desceu do cavalo e perguntou:
- Não quer o senhor trocar a sua vaca pelo meu cavalo?
O homem examinou o cavalo e viu que era bem forte e alimentado. Aceitou imediatamente, pois um cavalo vale mais do que uma vaca. Nesse ponto, o velhote poderia voltar para casa, mas resolveu ir até a cidade. Partiu a pé, dessa vez, e sempre assobiando alegremente.
Mais adiante encontrou na estrada um rapazinho que carregava uma ovelha muito bonita.
"Aquela ovelha seria ótima para nós. Não gastaria um tostão para alimenta-la e com sua lã poderíamos fazer uma almofada para pôr os pés nas noites de frio".
Imediatamente chamou o rapaz:
- Se eu lhe der a minha vaca, você me dará a sua ovelha?
O outro não perdeu tempo em fazer a troca: deu a ovelha ao velhote e foi embora com a vaca, muito contente.
O camponês continuou pela estrada e, depois de certo tempo, viu que vinha em sua direção um homem que trazia sob o braço um grande ganso.
"Como me agradaria aquele ganso! Ele ficaria na poça d'agua, com um barbante amarrado nas patas, e faria uma bela figura! Tanto mais que minha mulher sempre diz que precisamos de um ganso. Muito bem, ela o terá". Imediatamente, disse:
- Caro senhor, não quer trocar o seu ganso por esta ovelha?
O homem do ganso aceitou incontinenti e se afastou apressadamente, com o temor de que o camponês mudasse de idéia.
Já se viam as primeiras casas da cidade e a estrada principiava a mostrar-se cheia de pessoas e animais. O velhote passou diante da plantação de batatas do fiscal de impostos e viu, presa a uma árvore, uma gorda galinha que o seu dono amarrara, com receio que fugisse. Pensou: "aquela galinha é magnífica! É mais bela do que as do padre. Se fosse nossa, ela mesmo arranjaria o que comer e nos daria ovos frescos todos os dias". Então disse ao fiscal:
- Vamos fazer uma troca? Eu lhe dou meu ganso e o senhor me dá a sua galinha.
- Bem, se o senhor quer mesmo... – respondeu o fiscal contentíssimo. E se fez o negócio.
Agora o nosso camponês estava mesmo cansado e, vendo uma hospedaria, decidiu descansar um pouco. À porta encontrou o hospedeiro que vergava ao peso de um saco.
- Que é que tem aí dentro? Perguntou curioso.
- Maçãs podres para os porcos.
- Ah! – exclamou o velhote. Como gostaria que a minha mulher visse! Nós temos uma macieira que, no ano passado, deu apenas uma maçã. Mas minha mulher sempre repetia: "De qualquer forma, é uma colheita..." Se o senhor quiser, trocamos o saco de maçãs por esta galinha.
O hoteleiro aceitou a troca e o velhote, contentíssimo, entrou na hospedaria com o saco e foi encostá-lo a estufa. Em seguida, sentou-se para beber um gole de "acquavite". A hospedaria estava repleta de gente e, dentre tantos hóspedes, haviam dois ingleses muito ricos. A atenção deles foi atraída pelos rumores que saíam do saco: eram as maçãs que fermentavam e estouravam por causa do calor.
- De que se trata? – perguntaram curiosos.
- São maçãs podres que levo para minha mulher. Como ela ficará contente! – E o camponês contou toda a sua história. Os ingleses morriam de rir.
- E o senhor diz que sua mulher ficará contente! Ela ficará furiosa!
- Jamais! – exclamou o velhote, escandalizado. – Jamais! Minha mulher me dará um beijo e me dirá: " O que você faz é sempre bem feito."
- Apostamos? – replicaram os ingleses. – Se a sua mulher se comportar dessa forma, nós lhe daremos um saco de moedas de ouro.
- Contento-me com um punhado – respondeu o camponês. – Da minha parte, aposto um punhado de maçãs podres.
Os ingleses aceitaram e todos juntos encaminharam-se para a casa do camponês. O velhote bateu à porta e sua mulher correu a atende-lo e o beijou.
- Bom retorno, meu velho! Como foram os negócios?
- Muito bem – respondeu o camponês, entrando com os ingleses. – Troquei o cavalo por uma vaca.
- Deus seja louvado! Assim poderemos beber leite todos os dias.
- Mas depois mudei de idéia e troquei a vaca por uma ovelha.
- Melhor, melhor! Assim, teremos leite e queijo, e com a lã faremos malhas e meias.
- Depois troquei a ovelha por um ganso.
- Magnífico! Finalmente, poderemos comer um ganso!
- Mas em seguida troquei o ganso por uma galinha!
- Uma galinha? A, se você soubesse há quanto tempo eu queria uma galinha!
- Mas depois dei a galinha em troca de um saco de maçãs podres.
- Oh, deixe-me abraça-lo! – exclamou a mulher, toda comovida.- Você é um gênio, meu marido, e o que você faz é sempre bem feito. Imagine que eu queria preparar-lhe uma fritada com verduras. Tinhas os ovos, mas não as verduras. Então, pedi as verduras de empréstimo a nossa vizinha, que me respondeu que eu não seria capaz nem mesmo de dar-lhe uma maçã podre. Muito bem, podemos dar-lhe um saco cheio!
Os ingleses olhavam estupefatos para marido e mulher. O camponês tinha realmente razão.
- Não veremos jamais uma prova tão grande e amor e estima – comentaram. E deram de presente aos dois velhotes um punhado de moedas de ouro."
" Destilai, ó céus, dessas alturas, e as nuvens chovam justiça; abra-se a terra, e produza a salvação, e ao mesmo tempo frutifique a justiça; eu, o SENHOR, as criei."(Isaías 45:8)