MAIS QUERO ASNO...: polêmica e debate por melhor compreensão
Minha crítica sobre a peça Mais Quero Asno..., publicada no Guia da Semana, suscitou diversas respostas em minha caixa de email, durante todos esses dias. Não pelo dito sobre a peça especificamente, e sim pelo meu questionamento sobre como o Fomento atua em sua análise, julgamento e seleção dos projetos. Contrários raivosos, discordantes cordiais, mensagens de apoio e felicitações. Um pouco de tudo, os quais, em menor ou maior intimidade, tratei de considerar e responder.
Consolidar o diálogo é uma das responsabilidades de um artigo crítico. Como se tem acompanhado em tantos outros blogs e páginas.
Publico, aqui, a troca de email com Alice Giordano, do Núcleo Estep, realizador da montagem de Mais Quero Asno... Os emails seguem pela ordem do debate.
RUY FILHO
19 de fevereiro
Olá, Ruy!
Acabei de ler sua crítica sobre o espetáculo “Mais Quero Asno Que Me Carregue Que Cavalo Que Derrube”. Participo do elenco e gostaria de esclarecer alguns pontos equivocados de seu texto.
A partir do momento em que realizamos um trabalho público estamos sujeitos às opiniões, desaprovações ou discussões que o trabalho suscita. O que quero evidenciar, portanto, não são as suas observações em relação à pouca qualidade da montagem e ,sim, a sua pouca informação para escrever a crítica.
A montagem do “Mais Quero Asno...” começou a acontecer bem antes do Núcleo Estep ser contemplado com o Fomento. O projeto que a Renata Soffredini enviou para a seleção do Fomento não foi para o “Asno” e, sim, (como saiu no Estado de São Paulo de 19, jan de 2007) para a pesquisa de um texto de Carlos Alberto Soffredini chamado “Trem de Vida” – formado por didascalhas cuja representação é baseada na expressão corporal e canto. A direção será de Eduardo Coutinho (não o cineasta), que tem uma extensa pesquisa sobre mimo. E o elenco não será o mesmo do “Asno”. Apenas alguns atores participarão dessa montagem.
O logo do Fomento foi colocado no cartaz, pois um espaço foi alugado para realização dos trabalhos do “Trem de Vida”. Em novembro e dezembro, a Renata e sua equipe realizaram oficinas de interpretação, expressão corporal e música (baseadas na pesquisa de circo-teatro de Soffredini) – que você pode confirmar através da Cooperativa Paulista de Teatro. E utilizamos esse espaço também para o “Asno”, pois um local de ensaio estava sendo a nossa grande dificuldade até então. Por isso quisemos colocar o Fomento como apoiador também.
Você nos ofende muito quando coloca o Núcleo Estep como um grupo caça-níquel e que tenta escrever seus projetos no formato à abocanhar o dinheiro do Fomento. A Renata Soffredini está com um desejo genuíno de continuar a pesquisa de seu pai e tem se empenhado para tanto. O resultado, é outra questão, mas enquanto artista ela está exercendo sua liberdade de criação.
Você achou os atores fracos e imaturos – e você está no seu total direito -, mas se engana ao dizer que somos atores aproveitadores do dinheiro do governo. Mesmo porque não recebemos nada para realizar o “Asno”. E todos realizam sua pesquisa individual para crescer como intérprete – somos formados em Artes Cênicas e seguimos buscando aperfeiçoamento.
Nossos objetivos, portanto, são bem maiores do que ganhar o Fomento para se aproveitar do dinheiro sem realizar nossa arte.
É desagradável receber um texto divulgado com informações falsas e que só revelam a despreocupação de seu autor com a veracidade das informações que escreve e de suas consequências.
Alice Giordano
21 de fevereiro
Oi, Alice.
Muito esclarecedor o seu email, posso incluí-lo no meu blog? Será importante ter tais considerações para os leitores que, então, não permanecerão apenas com as minhas críticas.
Mas quero esclarecer minha postura e minhas conclusões.
Sobre o Fomento, veja a questão pelo seguinte ponto: trabalhei sobre as informações que o espetáculo me forneceu. Ou seja, logo quando cheguei me falaram que o grupo era fomentado (ninguém, no entanto, me avisou que o "Asno" não fazia parte do prêmio). A mesma indicação percebi no cartaz da peça, onde o Fomento aparecia. A qual outra conclusão eu poderia chegar? Qualquer informação que necessite ser explicada ou pesquisa para verificar sua veracidade, obviamente não está informando corretamente.
Não acredito que uma crítica ou resenha, ao ser elaborada, tenha por seu autor a necessidade da pesquisa prévia de todos os meandros envolvidos. A arte deve ser capaz de traduzir e dialogar os seus objetivos e instrumentais. E foi nisso que me calcei. Se me enganei, é porque dispostas como estão as informações induzem a compreender erroneamente o que se quer comunicar.
Também não coloco na crítica efetivamente que o espetáculo é caça-níquel, e deixo claro que "nem todos os financiados são caça-níqueis".
O equívoco ainda é a comunicação. Pois sendo o Fomento voltado à pesquisa qualitativa, indignei-me (via a desinformação que descrevi antes) com a falta de clareza e profundidade da pesquisa na montagem do espetáculo. Há muito que ser discutido sobre isso. A direção da Renata acaba por simplificar demasiadamente a cena, construindo um espetáculo sem personalidade própria. Há a falta de pesquisa (ou aprofundamento) sobre os figurinos e iluminação, que não dão conta de criar uma plasticidade genuína, levando os personagens a se parecem mais com criações televisivas do que propriamente teatrais. Essa obviedade é cansativa e deixa os personagens desinteressantes.
Sobre os atores, é nítida a falta de um acompanhamento que conduza ao elenco (eu não disse que são atores aproveitadores!) ao mesmo registro interpretativo. O que se assiste são dez estudantes de teatro lutando por conta própria, cada um a sua maneira, para construir seus personagens. Não há uma amarração sobre isso, o que me faz deduzir que ou faltou aprofundar as pesquisas ou a direção não soube trabalhar os atores. Exemplos: alguns ainda berram o texto, há desafinações gritantes durante as músicas, não há hegemonia quanto à relação que se quer tratar entre público/platéia, o registro corporal vai do naturalismo acadêmico apreendido em sala de aula ao caricato, os sotaques são igualmente pouco trabalhados e em muitos momentos se confundem, etc.
A obrigação, eu entendo assim, de uma crítica é ir além do bom ou ruim, gosto ou não. E na verdade tento julgar pelo que assisto e nada mais. Não é o tom amadorista que me incomodou, mas a falta de originalidade estética e conceitual. Não entenda isso como o querer esquizofrênico pelo novo ou ruptura. Falo de uma visão pessoal sobre como abordar o texto e conduzi-lo à cena. Aí sim a verdadeira importância nas remontagens.
Desejo boa sorte na próxima montagem, e espero que, desfeito o mal-entendido, de alguma maneira as críticas técnicas que fiz sirvam para alavancar discussões ao grupo e incentive o aprofundamento e aprimoramento.
Uma última observação, não leve tudo para o pessoal.
Abraços,
RUY FILHO
21 de fevereiro
Olá, Ruy!
Bom receber sua resposta e esclarecer os mal-entendidos. O que nos incomodou realmente foi ver nosso grupo associado à grupos que se aproveitam de recursos públicos sem preocupações artísticas.
"Nada mais parece ser a montagem que mero pretexto para a obtenção do apoio financeiro."
Mas agora está claro que o "Mais Quero Asno..." não participa do Fomento... e entendemos como você tirou essa conclusão.
Gostaria muito que você incluísse meu e-mail em seu blog e retratasse a informação de seu texto. Pois volto a dizer, o que nos incomodou não foram suas críticas à montagem e, sim, seu mau julgamento de nosso caráter.
Quanto às observações feitas em seu último e-mail foram pertinentes e bem vindas pelo elenco. Vou repassá-las à diretora.
Abraço,
Alice Giordano
Consolidar o diálogo é uma das responsabilidades de um artigo crítico. Como se tem acompanhado em tantos outros blogs e páginas.
Publico, aqui, a troca de email com Alice Giordano, do Núcleo Estep, realizador da montagem de Mais Quero Asno... Os emails seguem pela ordem do debate.
RUY FILHO
19 de fevereiro
Olá, Ruy!
Acabei de ler sua crítica sobre o espetáculo “Mais Quero Asno Que Me Carregue Que Cavalo Que Derrube”. Participo do elenco e gostaria de esclarecer alguns pontos equivocados de seu texto.
A partir do momento em que realizamos um trabalho público estamos sujeitos às opiniões, desaprovações ou discussões que o trabalho suscita. O que quero evidenciar, portanto, não são as suas observações em relação à pouca qualidade da montagem e ,sim, a sua pouca informação para escrever a crítica.
A montagem do “Mais Quero Asno...” começou a acontecer bem antes do Núcleo Estep ser contemplado com o Fomento. O projeto que a Renata Soffredini enviou para a seleção do Fomento não foi para o “Asno” e, sim, (como saiu no Estado de São Paulo de 19, jan de 2007) para a pesquisa de um texto de Carlos Alberto Soffredini chamado “Trem de Vida” – formado por didascalhas cuja representação é baseada na expressão corporal e canto. A direção será de Eduardo Coutinho (não o cineasta), que tem uma extensa pesquisa sobre mimo. E o elenco não será o mesmo do “Asno”. Apenas alguns atores participarão dessa montagem.
O logo do Fomento foi colocado no cartaz, pois um espaço foi alugado para realização dos trabalhos do “Trem de Vida”. Em novembro e dezembro, a Renata e sua equipe realizaram oficinas de interpretação, expressão corporal e música (baseadas na pesquisa de circo-teatro de Soffredini) – que você pode confirmar através da Cooperativa Paulista de Teatro. E utilizamos esse espaço também para o “Asno”, pois um local de ensaio estava sendo a nossa grande dificuldade até então. Por isso quisemos colocar o Fomento como apoiador também.
Você nos ofende muito quando coloca o Núcleo Estep como um grupo caça-níquel e que tenta escrever seus projetos no formato à abocanhar o dinheiro do Fomento. A Renata Soffredini está com um desejo genuíno de continuar a pesquisa de seu pai e tem se empenhado para tanto. O resultado, é outra questão, mas enquanto artista ela está exercendo sua liberdade de criação.
Você achou os atores fracos e imaturos – e você está no seu total direito -, mas se engana ao dizer que somos atores aproveitadores do dinheiro do governo. Mesmo porque não recebemos nada para realizar o “Asno”. E todos realizam sua pesquisa individual para crescer como intérprete – somos formados em Artes Cênicas e seguimos buscando aperfeiçoamento.
Nossos objetivos, portanto, são bem maiores do que ganhar o Fomento para se aproveitar do dinheiro sem realizar nossa arte.
É desagradável receber um texto divulgado com informações falsas e que só revelam a despreocupação de seu autor com a veracidade das informações que escreve e de suas consequências.
Alice Giordano
21 de fevereiro
Oi, Alice.
Muito esclarecedor o seu email, posso incluí-lo no meu blog? Será importante ter tais considerações para os leitores que, então, não permanecerão apenas com as minhas críticas.
Mas quero esclarecer minha postura e minhas conclusões.
Sobre o Fomento, veja a questão pelo seguinte ponto: trabalhei sobre as informações que o espetáculo me forneceu. Ou seja, logo quando cheguei me falaram que o grupo era fomentado (ninguém, no entanto, me avisou que o "Asno" não fazia parte do prêmio). A mesma indicação percebi no cartaz da peça, onde o Fomento aparecia. A qual outra conclusão eu poderia chegar? Qualquer informação que necessite ser explicada ou pesquisa para verificar sua veracidade, obviamente não está informando corretamente.
Não acredito que uma crítica ou resenha, ao ser elaborada, tenha por seu autor a necessidade da pesquisa prévia de todos os meandros envolvidos. A arte deve ser capaz de traduzir e dialogar os seus objetivos e instrumentais. E foi nisso que me calcei. Se me enganei, é porque dispostas como estão as informações induzem a compreender erroneamente o que se quer comunicar.
Também não coloco na crítica efetivamente que o espetáculo é caça-níquel, e deixo claro que "nem todos os financiados são caça-níqueis".
O equívoco ainda é a comunicação. Pois sendo o Fomento voltado à pesquisa qualitativa, indignei-me (via a desinformação que descrevi antes) com a falta de clareza e profundidade da pesquisa na montagem do espetáculo. Há muito que ser discutido sobre isso. A direção da Renata acaba por simplificar demasiadamente a cena, construindo um espetáculo sem personalidade própria. Há a falta de pesquisa (ou aprofundamento) sobre os figurinos e iluminação, que não dão conta de criar uma plasticidade genuína, levando os personagens a se parecem mais com criações televisivas do que propriamente teatrais. Essa obviedade é cansativa e deixa os personagens desinteressantes.
Sobre os atores, é nítida a falta de um acompanhamento que conduza ao elenco (eu não disse que são atores aproveitadores!) ao mesmo registro interpretativo. O que se assiste são dez estudantes de teatro lutando por conta própria, cada um a sua maneira, para construir seus personagens. Não há uma amarração sobre isso, o que me faz deduzir que ou faltou aprofundar as pesquisas ou a direção não soube trabalhar os atores. Exemplos: alguns ainda berram o texto, há desafinações gritantes durante as músicas, não há hegemonia quanto à relação que se quer tratar entre público/platéia, o registro corporal vai do naturalismo acadêmico apreendido em sala de aula ao caricato, os sotaques são igualmente pouco trabalhados e em muitos momentos se confundem, etc.
A obrigação, eu entendo assim, de uma crítica é ir além do bom ou ruim, gosto ou não. E na verdade tento julgar pelo que assisto e nada mais. Não é o tom amadorista que me incomodou, mas a falta de originalidade estética e conceitual. Não entenda isso como o querer esquizofrênico pelo novo ou ruptura. Falo de uma visão pessoal sobre como abordar o texto e conduzi-lo à cena. Aí sim a verdadeira importância nas remontagens.
Desejo boa sorte na próxima montagem, e espero que, desfeito o mal-entendido, de alguma maneira as críticas técnicas que fiz sirvam para alavancar discussões ao grupo e incentive o aprofundamento e aprimoramento.
Uma última observação, não leve tudo para o pessoal.
Abraços,
RUY FILHO
21 de fevereiro
Olá, Ruy!
Bom receber sua resposta e esclarecer os mal-entendidos. O que nos incomodou realmente foi ver nosso grupo associado à grupos que se aproveitam de recursos públicos sem preocupações artísticas.
"Nada mais parece ser a montagem que mero pretexto para a obtenção do apoio financeiro."
Mas agora está claro que o "Mais Quero Asno..." não participa do Fomento... e entendemos como você tirou essa conclusão.
Gostaria muito que você incluísse meu e-mail em seu blog e retratasse a informação de seu texto. Pois volto a dizer, o que nos incomodou não foram suas críticas à montagem e, sim, seu mau julgamento de nosso caráter.
Quanto às observações feitas em seu último e-mail foram pertinentes e bem vindas pelo elenco. Vou repassá-las à diretora.
Abraço,
Alice Giordano