Inúmeros municípios portugueses, perderam a sua autonomia em 1895, por causa da reforma administrativa, decretada pelo Primeiro Ministro do Governo do Partido Regenerador, Ernesto Rodrigo Hintze Ribeiro.
Três anos depois, muitas das Câmaras Municipais foram restauradas, em 13-1-1898, sendo primeiro ministro José Luciano de Castro, do Partido Progressista.
Apetece citar a Infopédia acerca do clima político de então: "Durante o período conhecido como rotativismo o Partido Progressista alterna-se no poder com o Regenerador, entrando mais tarde num processo de declínio e enfraquecimento, marcado por acusações de corrupção e de descontrolo financeiro e ainda pela dissidência de uma fação do partido." (1)
A lista dos municípios anexados é extensa. Alcochete, Aljezur, Cadaval, Constância, Marvão, Palmela, Seixal, Sousel, Vila do Bispo,Vila Velha de Ródão são apenas alguns exemplos.
Como é sabido, no chamado Guião, apresentado há algumas semanas, pelo vice-primeiro ministro, para a Reforma do Estado, é proposta a agregação de municípios, uma ideia que a Troika em 2011 já sugerira, de forma mais brutal - extinção - para reduzir despesas.
O ex ministro Relvas optou então pela fusão e extinção das freguesias, processo que, por falta de um estudo ponderado, ainda anda aos solavancos.
Em Lisboa, dois Antónios, um Proa, outro Costa, subscreveram este ideário e redividiram em novas e maiores fatias, a cidade. No caso da freguesia onde moro (Estrela), que nasceu da morte de três- Prazeres, Lapa e Santos-o-Velho, ainda não há local definido, para os serviços da nova autarquia funcionarem, e a antiga sede da Junta de Prazeres, em vez de manter o nome, que define um território, foi rebatizada (e reduzida) com o nome de uma rua. Chama-se agora aquele espaço Centro Comunitário da Pampulha. Já houve mexidas nos funcionários, a lei da mobilidade dá muito jeito. E prevê-se, segundo o jornal Expresso que a Câmara transfira serviços para as nóveis freguesias, tais como Bibliotecas e Complexos Desportivos...a procissão ainda vai no adro...
A nova geração de políticos marca pontos, a meu ver negativos...
A Relvas se deve uma reorganização tão capaz, que por exemplo, Vale do Poço, uma aldeia dividida ao meio (uma parte pertencia a Mértola, Junta de Freguesia de Santana de Cambas, outra a Serpa, freguesia de Salvador), não foi mexida, na antiga e incoerente divisão territorial...
Ora, neste país tão genuíno, tão rico em estórias, no âmbito político, o novo executivo da Câmara Municipal de Santa Marta de Penaguião, justificou assim uma das suas primeiras medidas, ao que parece aprovada por unanimidade - a mudança de 13 de Janeiro, para 29 de Julho, do feriado municipal. Ou seja, em vez de festejar a sua autonomia, reconquistada no início do ano de 1898, através dos heróis de então, passa (como se os santos não tivessem as suas romarias e festejos anuais) sob o pretexto de criar uma marca, a celebrar o feriado no dia da Santa, abdicando do facto de ser uma entidade civil e pública, apagando a memória de um património histórico que julgamos importante, parecendo subordinar-se aos Cânones da Religião...
Explicam os novos decisores:
"Com
o objetivo de promover a Padroeira da Região Demarcada do Douro e para
dar jus ao seu nome, o executivo municipal penaguiense, desde a sua
tomada de posse no passado dia 12 de outubro, decidiu tomar algumas
decisões/medidas.
A
nova marca “Santa Marta” baseia-se no conceito de reviver a lenda do
Conde Guillon e da Santa, apostando no desenvolvimento do turismo, da
ação social, da educação e da economia. Com efeito, o executivo local
pretende “deixar de apostar no betão e no cimento” para se dedicar
principalmente às pessoas. Para tal, deverá pôr em prática, ao longo de
todo o seu mandato, algumas medidas, que já passam por:
-
Alterar a data do feriado municipal de 13 de janeiro para dia 29 de
julho, dia da Padroeira da Região Demarcada do Douro, podendo assim
assinalar a data com várias iniciativas culturais e protocolares, junto
da grande comunidade local e emigrante de Santa Marta de Penaguião,
fazendo da vila de Santa Marta o centro do “Douro” nesse dia".
Seguem-se as promessa de baixar o IMI, de abdicar do IRS, a favor dos locais, da valorização da castanha, da construção de uma escola EB2/3 para manter os jovens do concelho a estudar no território, etc. etc., o que em si, parecem boas medidas.
No entanto, a mudança do feriado municipal, deixando cair no esquecimento a data da restauração do concelho, trocando-a por ofertas aliciantes de bem estar, faz-me suspeitar que este concelho poderá não ter um futuro autónomo e que nos bastidores da política paroquial, alguns acordos devem andar a ser esboçados, para agradar a Coelhos, Seguros, Portas & Troikanos.
Régua e Vila Real, que absorveram Penaguião, durante algum tempo, podem voltar a ter - a par dos estrangeiros, que compram as quintas do Douro - a tutela da fragmentação deste território.
Como o Povo parece ter deixado o cérebro em local incerto, e como aconteceu na actualidade (veja-se o que sucedeu com o 5 de Outubro e o 1º de Dezembro, negociados entre dois ex-poderosos, o ex ministro Álvaro Santos Pereira e o ex-cardeal patriarca Dom Policarpo), todos os pretextos são bons para afirmar como diz uma múmia, que "estar vivo é o contrário de estar morto", valendo tudo.
Surpreendido (é verdade, ainda me espanto, após tudo o que já vi e escutei) com as atitudes do novo pessoal político, que nos governa, seja no Estado Central, seja nas autarquias, particularmente naquilo que concerne ao apagamento da memória identitária, tenho de citar uma frase de Dias Gomes, autor do "Santo Inquérito":
"Há um mínimo de dignidade que um homem não pode vender, nem em troca do próprio sol!"
Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)
(1) Partido Progressista. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-12-15].
Disponível na www: .