quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Passagens


São sete e meia e ainda estou no trabalho. Hoje morreu a mãe de uma amiga.
O tempo passa por nós, umas vezes sem darmos por ele, outras demasiado devagar, conforme as circunstâncias e conforme o que sentimos. O tempo é elástico, estica-se e encolhe, e quase nunca como queríamos que passasse.
O tempo passa. Ouvimos esta frase ao longo da vida vezes sem conta, sem lhe atribuirmos grande significado. Sabemos que é assim, porque é a vida e o modo como as coisas são. E um dia, de repente ou muito devagar, quase sem darmos conta, tomamos consciência do peso do tempo que já passou por nós. Do caminho que a nossa vida e todas as vidas à nossa volta tomaram. Há pessoas que desaparecem da nossa vida para sempre, porque morreram ou simplesmente porque nos afastámos. Tomamos consciência de tudo o que já não vamos voltar a ver ou sentir, como se despíssemos um casaco que nos abrigava do frio. Vamos às nossas memórias tentar recuperar esse calor de quando o tempo não tinha fim nem dimensão, mas tudo o que conseguimos vestir são apenas farrapos de uma roupa gasta pelo tempo. E de repente não sabemos onde nos abrigar. Sabemos que esse mesmo tempo que nos rouba o que conhecíamos e julgávamos como certo se há-de encarregar de nos trazer novos abrigos. Ou não. Talvez apenas o tempo nos ensine a viver desabrigados e a partir de certa altura tenhamos que enfrentar a vida como ela é, de frente, sem muletas nem abrigos temporários.
A partir de certa altura o peso de tudo o que deixámos para trás parece imenso, parece que somos, como alguém disse há dias, "uma ilha num mar de saudades".
Feitas as contas ao que o tempo nos levou, olhamo-nos despidos de abrigos e farrapos, e perguntamo-nos como foi que chegámos até aqui, quase sem dar por isso, e que espécie de pessoa vamos ser agora, com esta consciência tão física da ilha que somos. E neste estado de alma percebemos que, com o passar do tempo, demos muitas vezes demasiada importância a coisas sem importância e não tomámos atenção suficiente a outras. Se conseguirmos, e se ainda formos a tempo, mudamos de rumo e de perspectiva. Se não, o peso do tempo que passou arrasta-nos para o fundo do mar de saudades, e quando damos por isso vemos que não soubemos usar o tempo que tivemos, a oportunidade que nos foi dada.
A vida é tão curta, vendo bem... e quanto mais cedo nos apercebemos disso, mais cedo percebemos a importância de tudo o que fazemos, em tudo e em todos.