Um concurso da Academia Brasileira de Letras pediu que o participante desse um final diferente ao conto “A Cartomante”. É um excelente exercício. Fiz este. Diria a quem escreve que praticasse o procedimento. É muito difícil, mas bastante enriquecedor. Você tem que mudar de tempo, e mais sério ainda, aproximar-se muito da linguagem dos autores, no caso um dos mais sábios e conhecedores da língua portuguesa.
Não muitos sabem que Machado gostava, nos seus contos, mais de um final.
Um deles ele preparou foi o que segue, logo após Camilo ter consultado a bruxa que previa o futuro.
'Foi um grande alívio. A cartomante... Não fosse ela, estaria ainda apreensivo com o bilhete recebido.
Camilo respirava um ar mais leve, mas mesmo assim não se esquecia dos dizeres “vem já, já à nossa casa”; Vilela não era homem afobado.
O tílburi passava pela orla marítima, rápido.
Por fim, o portão da casa, por ele aberto, chamando pelo amigo. O jardim demonstrava cuidado do morador, que surgiu lívido, com um papel na mão, roupa amarfanhada e gestos impacientes, como louco fosse.
- Até que enfim! Veja isto.
E entregou a Camilo um papel com letra, desenhada, certamente para não ser reconhecida. A leitura foi rápida. A carta dizia que Rita estava na casa de um amante, indicando o local.
- Não é possível, Vilela! Rita jamais faria isso.
- Vamos lá agora. Fica tudo resolvido.
Vilela e Camilo traídos pela bela Rita. Este último mal estava de pé. Rumaram para o local onde dizia a carta, não sem antes prometessem um ao outro que não haveria violência, de acordo com a idéia macabra que tinham posto em prática.
Viram nitidamente. Às pressas, ela saía de uma casa com mau aspecto. Foi seguida com cautela, e perceberam que voltava para casa.
Vilela e Camilo não demoraram.
- Ora, estão a passear juntos!
- Fora, maldita seja. Vá com a roupa do corpo.
- Não estou entendendo...
- Vá antes que eu cometa uma violência!
Ela saiu amedrontada. Dirigiu-se para a casa de Camilo, que se despedia do amigo marcando encontro. Certa que encontraria um teto amigo.
Enganou-se.
Rita levou um empurrão quando quis se aproximar do antigo amante enfurecido, que lhe deu com a porta na cara.
Dizem que ficou tuberculosa, mas ainda hoje faz parte de um bando de mendigos que perambulam pelos lados da Candelária.'