terça-feira, 27 de março de 2012

Complexo


Alguém se percebe que é um ser inacabado, em construção, que o bem e o mal, o triste e o alegre fazem parte da essência do seu existir. Apesar de ser algo intrínseco ao homem, considero tal perspectiva paradoxal.

Mas, se outro indivíduo, ao se perceber, conclui que não sabe o que significa para si (pior, espera que os outros o definam), ele demonstra de forma evidente que não é complexo, e sim, mais um confuso. Odeio esse tipo de clichê.

Eu me vejo como uma mulher simples.  Sei quem eu sou e, por isso, confesso as inquietações para a psicóloga.

Hoje relatei um pensamento inquietante a ponto de também estar escrevendo essa crônica. Estava refletindo o quanto pessoas complexas são difíceis de encontrar. Pessoas complexas são aquelas que fogem a nossa compreensão de mundo por mais familiares que sejam. Durante minha vida, conheci somente duas.

Meu pai foi o primeiro. Era homem cheio de sabedoria, com história de vida incrível e, apesar da idade avançada, tinha olhos de criança muito vivos, cheios de brilho. Como ele atravessou as fases da vida para sentir o mundo dessa maneira? Eu realmente não sei. 

Outra pessoa complexa que conheci foi um espírito antigo preso no corpo de um jovem, a beira dos seus vinte e poucos anos. Ele é o que ainda busco dentro de mim. Por amor, envelheço minha alma.

A sessão foi terminada pela psicóloga. Lágrimas retidas.
   

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Enigma lunar

Os cabelos cortados
Fios viram emaranhados
Soltos para novos saltos
De que tamanho são?

Procuro a verdadeira cor
para os meus olhos
Entre a vida e a profundidade
Qual cor seria?

Você sabe
e insiste nas respostas
É uma mulher
com capuz vermelho
Vestida com tecidos de ar
Correndo por entre a floresta

É aquele rosto indefinível
com um corpo sem igual
Ela é linda
O lobo está a procurá-la
No final da história
Ela só precisa ser linda

Sangue, ossos
Sal e gordura
A carne tem seus sabores

Deixei os cortes expostos
Os olhos vivos de lilás profundo
Procure-me quando o lobo for morto
ou uivará para a Lua.


quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Entre nexo e sexo, dentre lírios e delírios



Faz me sussurrar
Ah, ah, ah...
Sons sem sentidos
Cem sentidos em sinfonia
Com a essência da vida

Minha pele vira mar
Te engolindo
Lindo, lindo...
Jeito, sintonia
Dois corpos e uma mesma medida

Leio seus movimentos
Sinto, sinto...
Sentimentos que não sei interpretar
Atores de um único momento
O nosso lar, nunca o mesmo lugar

O meu Eu se conecta ao seu Eu
Aproxima a direção de dois céus
Seu mel, meu mel...
Bocas bem unidas constroem poesias
Os nossos Eus em companhia

Cortando palavras, ferindo frases
Entre nexo e sexo
Dentre lírios e delírios
O amor costura suas faces...



Poema dedicado ao meu amor com muito amor y otras cositas más...

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Crônica de um andróide do sistema

O tempo me cobra o dinheiro que não produzi
É hora de trabalhar!
Produzir bens para o bem do meu patrão

Tenho que correr para me libertar
As asas já foram desconectadas para eu ficar no chão
A realidade perdura… e é dura demais para bater com os punhos
Já perdi o ônibus!

O jornal não informa qual é a minha atual situação
Quer me manter feliz com fotos de garotas seminuas
Com horóscopo, futebol, violência brutal da cidade,
Resumo de novelas da vida burguesa que nunca vou ter

Meu professor do ginásio dizia para a gente ler livros
Era para gente ficar inteligente se fizesse isso
Mas como ler se eu nem sei interpretar os códigos?
São páginas demais e eu tenho que trabalhar!

Quem é último perdeu a oportunidade de ri
Por isso invento piadas ao ver as vidas de outros na TV
Tão cheias de verdade como os discursos políticos

Meu pai uma vez me disse:
Quem tem consciência, tem mais responsabilidade
Se eu sou um duro que não pode nem comprar dignidade
Sobrevivo nem sei como
A responsabilidade que tenho é manter a engrenagem do sistema
Como posso ter sabedoria para acabar com algo que mantém
viva a minha miserável vida?
E agora, quem poderá me defender?

O que é ser um ser humano?
Pois não sou um há muito tempo…

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Teste para uma pintora aprendiz

 

Eu lembro quando testava você: "Será que ele pode suportar minha existência em uma coexistência?". Nunca pedi para você me carregar nos ombros e nem quero isso. Só quero que me acompanhe durante o máximo que pudermos. Eu gosto de correr, porque a vida parece tão curta... "Então, curta!", eu digo isso para eu ouvir alguma música por entre as palavras. Aproveitar toda a totalidade do viver neste finito espaço de tempo que não vai durar mais do que um século. Odeio ficar parada no mesmo lugar. Odeio. Mas você, novamente você, soube me esperar com toda a paciência e amor que eu não poderia esperar se não ficasse por algum tempo parada.

Aonde eu quero chegar com isso? Com plena consciência, a testada fui eu. Tive que aceitar minha limitações. Abracei meu Eu, dei um beijo nele. Amei todos as suas dimensões mensuráveis ou não. É preciso parar para que as imagens da contemplação tenham tempo de chegar aos olhos do coração. Foi o momento que passei a desenhar-lhe em tintas frescas, meu amado príncipe.