As cores todas balançando ao vento nos varais da estrada. Serra acima,
lentamente, a desenfreada pulsação abranda, impregnada do sussurro manso
que ecoa sutil por entre as copas verdes. A vida pulsa, plena e viva,
em seu próprio e descansado ritmo, a alma, leve, dança. Os anoitecidos
olhos, intoxicados de concreto e medo, agradecem os multitons das matas
densas pinceladas de delicadas flores. É bonita a umidade solene
escorrendo prateada por entre as pedras lisas. É suave o amanhecimento
paulatino do tão maltratado coração - os pássaros, o pasto, o gado, as
incontáveis estrelas no céu, as Minas Gerais, o amor, ouro de puríssimo
esplendor.
No caminho, deitado à comprida sombra de um umbuzeiro, um pequeno homem inteiro assobia cantigas baixinho, revirando nas mãos o chapéu em remendos. Não há pressa em suas longas horas mansas, não há lonjuras em seu hoje branco. Lá, o dia ignora sem dó os inúteis ponteiros e aponta, certeiro, a semente na terra. O tempo é só dela e ele, prendado, espera. Um pouco à frente, uma senhora de rosto queimado, lenço amassado e poucos dentes grita, da maltratada cerca, a meninada de pés poeirentos. Eles gargalham, meninos que são, enquanto correm atrás da mestiça galinha que, sem rumo, sacode as curtas asas como se, por um passe de mágica, pudesse voar. Galinhas não voam, mas a criançada de lá sempre me parece que sim.
Chegando à casa, olhos marejados, janelas e portas abertas, o sorriso liberto brota mansinho, o horizonte sem fim mais e mais se estende, o calor acolhedor do amor afaga, cuidadoso, as tantas cicatrizes fundas dessa dura vida, desse mundo louco, enraivecido cão. Os cheiros, os gostos, os planos, os sonhos cerzidos aos pares, os pequenos tão livres e inteiros, a música, os abraços, os passos, o coração aprumado e sereno, seguro no reconhecer-se em outros, espelho – e esse acreditar inesgotável e eterno que, na volta, sempre trago comigo palpitando no peito, de no amor e no bem jamais deixar de construir e ser.
No caminho, deitado à comprida sombra de um umbuzeiro, um pequeno homem inteiro assobia cantigas baixinho, revirando nas mãos o chapéu em remendos. Não há pressa em suas longas horas mansas, não há lonjuras em seu hoje branco. Lá, o dia ignora sem dó os inúteis ponteiros e aponta, certeiro, a semente na terra. O tempo é só dela e ele, prendado, espera. Um pouco à frente, uma senhora de rosto queimado, lenço amassado e poucos dentes grita, da maltratada cerca, a meninada de pés poeirentos. Eles gargalham, meninos que são, enquanto correm atrás da mestiça galinha que, sem rumo, sacode as curtas asas como se, por um passe de mágica, pudesse voar. Galinhas não voam, mas a criançada de lá sempre me parece que sim.
Chegando à casa, olhos marejados, janelas e portas abertas, o sorriso liberto brota mansinho, o horizonte sem fim mais e mais se estende, o calor acolhedor do amor afaga, cuidadoso, as tantas cicatrizes fundas dessa dura vida, desse mundo louco, enraivecido cão. Os cheiros, os gostos, os planos, os sonhos cerzidos aos pares, os pequenos tão livres e inteiros, a música, os abraços, os passos, o coração aprumado e sereno, seguro no reconhecer-se em outros, espelho – e esse acreditar inesgotável e eterno que, na volta, sempre trago comigo palpitando no peito, de no amor e no bem jamais deixar de construir e ser.
Sylvia Araujo