O propósito inicial deste Blog foi o registar, como num diário, as nossas aventuras no mundo vertical!
Para que o esquecimento não apaga-se os momentos mais ou menos felizes, que constroem a nossa história.
Tempos passaram, outras aventuras e compromissos, também alguns constrangimentos, pela tomada de consciência de que o Abismo Branco, já não era o nosso "diário", mas um Blog lido, fez com que as memórias aos poucos fossem menos registadas e que as "postagens" neste Blog fossem cada vez mais esparsas. Temo que algumas foram já esquecidas e sinto-me por vezes com uma nostalgia constrangedora e nesses momentos sou impelido a resgatar das frágeis amarras da memória, algumas aventuras que ficaram por contar.
Vou começar por resgatar uma aventura nos Alpes em 2015, por onde andamos 24 dias!
Segundo a estatística a esperança de vida média do "português" são 29 354 dias! Gostava que pelo menos 1000 dos meus dias fossem passados na terra da Heidi. Muito influenciado pelas "Etoiles et Tempêtes" do Gaston Rébuffat (talvez o mais romântico dos escaladores) fomos aos Alpes em 2015.
Devido a alguns imprevistos no trabalho já estávamos atrasados dois dias em relação ao inicialmente previsto, o que deixou em pé os cabelos do Marco Cunha, que já se encontrava por lá. Nisto das montanhas no estrangeiro, segundo teorias dele, as janelas de bom tempo não se podem perder. E pelo ensimesmado que o encontramos quando lá chegamos dois dias depois, certamente já tinham passado várias dessas tais janelas.
Para nós era tudo novo e espectacular, e tínhamos inusitadamente muitos dias pela frente! Podemos até começar a ambientar-nos pelo "franguinho de churrasco", nome carinhoso para escalada desportiva, pela facilidade que aporta em contraste com "gastronomias" mais requintadas.
Começamos por conhecer Mont-Dauphin, um local muito pitoresco, que conta com cerca de 100 vias de escalada em Conglomerado, para todos os níveis. Muito bom para iniciação, bem equipado e com muitas vias fáceis: placas, verticais, diedros, extraprumos, de tudo um pouco. Dispõe de estacionamento fácil e menos de 10 minutos de aproximação para qualquer dos sectores. Para além de oferecer quase todas as orientações. Está a cerca de 1000 metros de altitude e é ideal para primavera / verão / outono. Existem supermercados, cafés e padarias perto. Ficamos a dormir na carrinha e não houve nenhum problema, embora não saibamos se é permitido ou não.
Rue de Masques |
Há festa na aldeia! |
Apartheid. |
No segundo dia assistimos desde o vale a uma tempestade Assustadora nos Écrins! Felizmente estávamos cá em baixo, mas é indescritível a violência. parecia que estavam a explodir montanhas.
No Terceiro dia viajamos para a zona de Grenoble, onde havia mais frango de churrasco e o MC iria ter com uma amiga Lisboeta, que talvez inspirada pela história da Heidi, veio ter com uma amiga que falava francês chamada Véronique.
Não longe da cidade de Grenoble à qual se pode chegar até de avião, existe Presles, tudo isto ainda em France.
La plus belle falaise du mode, aprés falaise du barre. |
17 Agosto - Aguja Dibona.
Ver a Dibona pel primeira vez é surpreendente, um misto de deslumbramento com incredibilidade. Uma pirâmide que se vai afiando até ficar numa agulhinha fininha e esticada. Isto lá longe, no alto, no meio das montanhas, de uma forma majestosa e destacada.
"A melhor via de 6a da Europa!!!" |
Chegamos ainda não tinha caído a noite, tivemos tempo de montar tenda e cozinhar, apesar dos efeitos da altitude fazerem-se sentir e influenciar negativamente o apetite.
A "Visite Obligatoire" é um hino à escalada, uma dança num palco de granito alaranjado de excelente qualidade. Apesar de totalmente equipada é necessário subir bastante para avistar a próxima “chapa” que permita a proteção e algum conforto para o cérebro, que acaba por sair mais cansado do que o próprio corpo. A exigência de navegar acima do ponto sem muita margem para erros, uma queda daria para bater muitas vezes as asas, a exigência da leitura constante do “melhor” caminho porque alguns desvios do itinerário disparava imediatamente o grau, só era temperada pelas grandes vistas e pela coreografia da escalada em si. Movimento específico da escalada em granito, com os seus cruzamentos em aderência e passos de vírgula no limiar do equilíbrio.
A parte final extremamente “alpina” com a sua aresta tipo fio de navalha, e o rappel curto (pelas traseiras), são a cereja em cima deste delicioso bolo. Esta via é um “must have” para qualquer escalador mais desportivo mas com sede de aventura, obrigatório que tenha o “Vº” bastante consolidado e o anexo que fica por baixo do capacete bem mobilado!
Framboesas selvajens para recarregar energia. |
O contingente tuga continuava a crescer e porque estávamos na zona dos Écrins a bússula de escalador apontava para a Meije, uma muralha muito muito alta de pedras coladas com gelo que está a derreter, uma mistura explosiva, que teríamos muito gosto em provar, não tivéssemos nós ainda a barriga cheia.
Por esse motivo ou outros mais obscuros, decidimos não subir com os intrépidos camaradas, mas permanecer no vale mais um dia e subir no dia seguinte só para ver as vistas.