Um Benfiquista que festeja, que celebra ou que simplesmente está feliz é automaticamente arrumado sob a etiqueta da tal «soberba». Não importa se tem razões para estar contente ou se simplesmente fala com alegria da equipa que o alegra: tem «soberba lampiónica», ponto.
Às vezes, ponho-me a pensar em quem nos avalia - nos nossos comentadores, no cidadão comum que é adepto de outro clube, nos nossos juízes de costumes, nos nossos críticos, nos nossos censores morais, de um modo geral. Em cada esquina há um olheiro que toma notas sobre o nosso comportamento - desde a nossa reacção no momento da vitória, às músicas que ouvimos ou fazemos, passando pela ideologia que defendemos (ou não) e a nossa relação com a política deste Estado: todas as escolhas que fazemos, seja na hora de criar, seja na hora de aceitar, são escrutinadas por terceiros.
Pois então, tenho umas coisas para vos dizer. Quando olho, por exemplo, para a nossa "crise" - que é tão comentada e tão avaliada por gente que, no fim do comentário, se mete no seu BMW X5, no seu Range Rover, no seu Porsche Carrera -, avalio-a como quem não apenas a olha de perto; sinto-a antes como alguém que chega ao ponto de a sentir na pele. Eu sei o que significa "crise". E não é nada daquilo que vocês dizem, com conceitos muito aparentemente técnicos e terminologia a transbordar de estrangeirismos - crise é não ter dinheiro nem trabalho. Isso é que é crise. Portanto, não me digam o que fazer com quem me governa, nem me apontem em quem devo votar ou se devo votar ou não - a minha vontade de meter uma cruz em alguma dessa gente vai muito para lá da caneta e do papel.
E quando ouço uma banda na rádio ou leio sobre ela na imprensa, tenho de a respeitar. Posso não gostar do que ouço, posso até nem simpatizar com a atitude ou com a pose - mas se estou a ouvi-la é porque, no mínimo, aquela gente trabalhou no duro o suficiente para chegar ali, aos meus ouvidos. E isso merece-me respeito. Portanto, quando a criticarem pensem nisso: aquela gente trabalhou, ensaiou, sofreu ao vivo, carregou amplificadores, baterias e guitarras, conquistou público, perdeu dinheiro e fez tudo isto por amor a uma única coisa: a sua própria música. Isto tem de merecer respeito.
Não me quero dispersar - eu tinha tanta coisa para dizer sobre o assunto -, quero mesmo apontar o dedo a quem mo aponta a mim: eu não vejo o Benfica no sofá, nem sequer num camarote. Vejo-o no Terceiro Anel e vejo-o sempre que joga em casa - seja quando vem de derrotas com o Marítimo na primeira jornada, seja quando está a um passo de se sagrar campeão, quer chova, faça sol ou voem pedaços de lã de rocha e placas de zinco. Eu estou lá.
Eu, que o ano passado perdi tudo em quinze dias, estou lá e continuarei a estar. Se sofri? Eu sofro até quando estamos a ganhar 3 a 0 à Académica e faltam sete minutos para acabar porque "isto ainda pode dar a volta". Portanto, quando Jesus caiu de joelhos, quando o Enzo caiu sobre o peito, em lágrimas, quando o Cardozo perdeu a cabeça, eu não sofri: eu mudei. Eu festejo o que me apetecer quando eu quiser e vou ao Marquês todos os dias se me aprouver, só para fazer o reconhecimento do terreno: eu ganhei esse direito naquele mês de Maio de 2013 que a minha memória não há-de apagar nunca. Não, não vou guardar os festejos para o fim. O ano passado o Benfica deu-me uma grande lição: festeja sempre que puderes. Pois, é isso que tenho feito. E a vossa soberba crítica é muito pior que a minha soberba lampiónica.